Rio Grande do Norte, quinta-feira, 28 de março de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 13 de junho de 2012

Direito da democracia: partidos políticos, fidelidade e autoritarismo

postado por Carta Potiguar

Por Jules Queiroz, advogado

 

A prestigiada reforma política (supostamente) em curso no Brasil se resume a uma reforma meramente eleitoral.

De fato, o sistema eleitoral precisa de reformas. Contudo, uma verdadeira reforma política não se resume a uma reforma no sistema de sufrágio, mas sim a uma análise do real funcionamento das relações entre Executivo e Legislativo, bem como entre esses poderes e os Partidos Políticos que lhes dão sustentação.

O sistema político-partidário brasileiro, a nosso ver, é cruelmente deformado. Fora uns poucos (notadamente os partidos de esquerda, como o PSOL e PSTU), não há identidade ideológica alguma nos partidos políticos.

Tanto é assim que os representantes partidários em âmbito municipal não têm o menor constrangimento de fazer alianças com partidos que, em âmbito nacional, são seus ferrenhos adversários. Essa prática, ressalte-se, é aplaudida pelos dirigentes nacionais sob o pretexto de “respeitar as realidades locais”.

Dessa forma, cria-se uma “partidarização” de interesses pessoais dos dirigentes, posto que os partidos são guiados a partir das ânsias de poder de indivíduos, não de ideais coletivos. Tanto é que, nos noticiários potiguares, não é incomum ver referencias ao “partido de fulano” que se aliou ao “partido de cicrano”. 

Partidos, no Brasil, não têm líderes. Têm donos.

Algumas poucas reformas nessa situação, como é evidente, não nascem dos próprios partidos através do Poder Legislativo e Executivo, mas do Poder Judiciário.

Caso evidente é a imposição da fidelidade partidária aos detentores de mandato eletivo. O famigerado “troca-troca” de partido foi declarado inconstitucional, sob pena da devolução do mandato ao legítimo detentor: a agremiação partidária. 

Com essa decisão, esperava-se que o Supremo Tribunal Federal tivesse aumentado a força dos partidos, promovendo, assim, uma maior participação dos filiados e definição de uma ideologia partidária. 

A despeito do propósito e fundamento republicano dessa decisão, criou-se um novo monstrengo nos seios dos partidos: a ditadura partidária interna.

Vendo o poder que tinham sobre os detentores de mandato, os dirigentes partidários passaram a exercê-lo de forma mais abrangente, buscando, mais uma vez, interesses pessoais politiqueiros, jamais partidários ou republicanos. As decisões internas passaram ainda mais aos líderes, deixando as bases partidárias a ver navios.

Uma prática comum hodiernamente é a criação de Comissões Provisórias em âmbito estadual e municipal ao invés de Diretórios. É que essas comissões podem ser destituídas livremente pelos Diretórios superiores, sem maiores garantias aos dirigentes locais. 

Vê-se, assim, uma distorção ainda maior no sistema partidário brasileiro: a fidelidade partidária sem democracia interna.

Se já cultivamos ditadores dentro dos partidos, como esperamos que, eleitos, promovam a democracia?

Carta Potiguar

Conselho Editorial

4 Responses

  1. Zezim disse:

    Perfeito.

  2. Americo disse:

    PSOL com identidade ideológica? Estamos falando do partido que se aliou em SP e em outros estados aos Tucanos e, seletivamente, a nível federal também, quando lhe foi conveniente? É o mesmo partido que saiu das entranhas do PT por mera ambição de poder para grupos específicos insatisfeitos? O artigo merece retificação nesse ponto. No restante, está excelente.

  3. Guto_chico disse:

    Quem imaginou que os tempos de ACM e Bornhausen mudariam, enganou-se. Hoje temos Lula, que é o maior sinal atual de retrocesso. Seu candidato na cidade de São Paulo, o Haddad, tem apoio do Maluf! Talvez por isso que o Marco Maia (PT) quase colocou a Lei Maluf para votação, a lei que vai infernizar o combate à corrupção. Não é só a “secretaria” que Maluf ganha, não! Maluf também tem orgulho, como todo petista, quer mesmo é ferrar com o MP. Esse camarada tem uma ficha linda na Interpol, invejada por todo petista: 
    http://www.interpol.int/Wanted-Persons/(wanted_id)/2009-13608. Não é à toa que estão juntinhos em São Paulo. Detalhe: por incrível que pareça, quem impediu a votação da Lei Maluf foi ACM Neto. É, rapaziada, os tempos de crítica estão difíceis, não?

  4. Dennyslucas13 disse:

    Algumas considerações:
    1 – Não é pelo sistema eleitoral vigente que se arquiteta a imprescindibilidade de aliança que se verifica a identidade ideológica, até porque é este mesmo sistema que impõe esta tática, mas por suas resoluções e programa partidário. Assim também, se deve considerar que o resultado das tomadas de decisões não segue a risca o programa e identidade partidária, porque estas decisões devem considerar o respaldo social, viabilidade conjuntura e perspectiva de manutenção do poder, digo isto, então, para discordar que só PsoL e PSTU tenham identidade ideológica, e partidos de esquerda, há também identidade ideológica, e o DEM deu bons exemplos nas suas investidas no STF recentemente;
    2 – Sobre democracia internas, apesar da exceções, ainda é exemplo o PT, se Mossoró e Recife, ou outros mais cinco cidades forem lembradas, só reafirmar a excepcionalidade dessas ações, o PT continua a forjar sua disputa interna. Uma reforma política tem de chegar ao questionamento sobre a democracia das organizações, acho que é um limite preocupante, mas que deve ser considerado, ou sua pergunta continuará sem resposta, ou pior, continuará tendo as respostas do jogo político visto
    Dennys Lucas

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