Rio Grande do Norte, quarta-feira, 17 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 11 de agosto de 2015

Soletre: “Educassao”

postado por Paulo Emílio

Sábado passado estava no barbeiro esperando minha vez para cortar o cabelo. Tinham 4 caras na minha frente, então liguei o psp e fiquei de boa jogando. A TV ligada passando o programa do Luciano Huck. Que ele é um imbecil, não é novidade. Ignorei o programa e voltei a jogar. Até que começou o “Soletrando”.

Continuei a ignorar, mas todos que estavam na barbearia passaram a prestar atenção e a palpitarem as palavras. Acabei me desconcentrando no jogo e, então, resolvi assistir o quadro.

De imediato, já não gostei do formato. Ora, dar prêmio para quem sabe escrever uma palavra? Achei estranho, mas deixei pra lá, afinal o prêmio era de R$ 50 mil reais para ser investido em educação. Num país em que a educação não está lá essas coisas e, quando tem um governo preocupado em melhorar, aparecem pessoas até da mesma corrente ideológica para criticar negativamente (mas, isso é outro assunto), R$ 50 mil é uma excelente quantia; dá para pagar uma pós fora do país e dar a oportunidade de bolsa para outra pessoa.

Enfim, o quadro era um “mata-mata” entre dois ex-campeões. No começo, palavras de fácil grafia, depois foi aumentando o nível delas. Os dois participantes acertando, até que chegou a palavra “tossir”. Nada demais, afinal pode causar confusão (para um/uma estudante de Ensino Médio, adolescente, numa competição e na TV) entre o uso de “ss” ou “c”. O alerta veio quando a participante pediu aplicação do verbo numa frase.

APLICAÇÃO DO VERBO TOSSIR NUMA FRASE???solerando

Em caixa-alta mesmo, porque fiquei doido ao ver essa pergunta. Uma estudante de Ensino Médio, campeã de um quadro em soletrar palavras, não saber aplicação de um verbo bastante comum no nosso vocabulário é inadmissível.

Bem, a culpa não é ela; ela é vítima nessa história. Porém, não vou entrar nessa questão. O que eu quero dizer neste texto é o desserviço (mais uma vez?) que a Rede Globo faz em (des?)favor à educação e aos/as estudantes brasileiros.

A iniciativa do programa em premiar, ainda que seja com dinheiro dos patrocinadores (que poderiam criar outros meios para premiar, vale salientar), é boa. Entretanto, priorizar a memorização de palavras em detrimento do significado delas é altamente antididático; é retroceder no ensino.

Qual o sentido em saber como a palavra é escrita, mas não saber o significado dela? O nome disso é analfabetismo funcional. E engana-se quem acha que isso acontece só no ensino básico público. O Indicador de Analfabetismo Funcional (INAF) de 2012 mostrou que 32% dos universitários são analfabetos funcionais. Outra pesquisa, do ano passado, pela Universidade Católica de Brasília, aumentou este número para 50%. Neste último caso, a pesquisa se restringiu somente em Brasília. De qualquer forma, 32% de universitários analfabetos funcionais é um número bastante alto. Estudantes nessas condições é que irão sair dos bancos das universidades para assumirem salas de aulas nas escolas.

E isso acontece com todas as licenciaturas. De que adianta memorizar as fórmulas de Matemática e Física, os elementos de Química, as datas de eventos importantes na História, os nome científicos em Biologia, as capitais dos estados e países em Geografia sem compreender o real significado que cada conceito apresenta?

Como se já não bastasse isso, há dois dias li uma reportagem sobre o que governo do estado de Goiás estava fazendo: colocando a Polícia Militar para administrar as escolas públicas. Pior do que a reportagem enaltecendo a PM e mostrando que até ano que vem serão mais 24 escolas, os comentários dos/das usuários/usuárias é de…. é de… é de……….

 

Paulo Emílio

Pedagogo que tem um diploma de Geografia, adora Nutrição, admira a Sociologia, tem uma queda pelas questões ambientais e, nas horas vagas, gosta de jogar enquanto com um caldinho de feijão verde (sem manteiga, por favor)

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