Rio Grande do Norte, quinta-feira, 25 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 7 de outubro de 2015

“Bandido bom é bandido morto”?

postado por Paulo Emílio

E a pergunta de hoje é essa máxima de bandido bom é bandido morto. Por que faço essa pergunta? Por que eu sempre tenho o (des?)prazer de ler todo os dias, quando abro o facebook, um festivalprisão de gente destilando ódio contra aquelas pessoas que comentem crimes. Não são somente crimes chocantes, como assassinatos, mas também os pequenos, como furtos, roubos etc. A reação é sempre a mesma: tolerância zero. Para elas, qualquer pessoa que comete qualquer tipo de crime não tem mais “cura” e, por isso, precisa ser “eliminada”. Quer dizer, tirem as aspas! Eliminada mesmo; erradicada, exterminada e, de preferência, com bastante tortura, afinal a vida dela não é suficiente para pagar o crime que cometeu.

Deixando de lado por um instante a incoerência do discurso anti-violência, bem como o sadismo in(?)consciente, sabiam que há uma estimativa de que 90% das pessoas que estão presas, ou melhor, em privação de liberdade são cristãs?

“Ahn Paulo, mas como assim?”

Sim, isso mesmo que vocês leram. Estima-se que 90% das pessoas em privação de liberdade são cristãs.

“Ah Paulo, mas elas não eram cristãs antes de cometerem crimes”

Bem, se levarmos em consideração de que a sociedade precisa ter algo “sobrenatural” para temer e, assim, não cometer crimes, essa afirmação se torna real. Ora, nada mais assustador que uma pessoa saber que se roubar, estuprar e/ou matar ela poderá, após a morte, ser enviada para um lugar quente e sofrer durante toda a eternidade. Há quem acredite nisso e, se isso está funcionando para evitar que as pessoas partam para à criminalidade, quem sou eu para discordar?

As religiões cristãs (católica, evangélicas e espíritas) estão presentes nas penitenciárias (e centros de detenção)  trazendo a palavra de Deus para essas pessoas. A Pastoral Carcerária, da Igreja Católica, realiza este trabalho há quase 30 anos. A Aliança Evangélica (de origem neopentecostal) já atua há quase 5 anos. Os Espíritas há quase 10.

O que eu quero dizer é que essas religiões juntas representam uma enorme e grande maioria (bem enfatizado) da população brasileira. Todas essas vertentes acreditam que as pessoas mereçam uma chance para se redimirem de seus crimes (ou pecados) e, isso, fundamentado na Bíblia – Hebreus 13.3: “Lembrem-se dos que estão na prisão, como se aprisionados com eles; dos que estão sendo maltratados, como se fossem vocês mesmos que o estivessem sofrendo no corpo” – afinal, até o filho de Deus foi crucificado e morto como bandido.

“Ah Paulo, mas elas se tornaram cristãs só para obterem benefícios na cadeia” 

E como vocês vão atestar isso? Será que o livre arbítrio que vocês tanto pregam não é suficiente? E aquela história de que só Deus pode julgar uma pessoa? Neste caso não procede?

“Ah Paulo, você é muito inocente em acreditar que esses vagabundos querem mesmo ser salvos”

836_22_presidio_7308A questão não em ser inocente ou não em acreditar; a questão é que, de acordo, com o Deus que vocês seguem, todas as pessoas que cometeram crimes têm o “direito” de serem salvas. Novamente retiro as aspas, no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, qualquer pessoa têm o direito à educação.

Em outras palavras, tanto no meio religioso, quanto no humano, enxerga-se a não perfeição dos seres humanos e admitem que há a possibilidade de errar, admitir o erro e ser outra pessoa.

A cadeia não deve ser punitiva, mas sim um espaço que promova uma ressocialização; que faça com que a pessoa reflita sobre seu crime e dê uma oportunidade para ela não voltar a cometer o crime.

“Ah Paulo, tudo bem, mas é uma minoria quase total que se redime”

E qual o problema? Existem mais de 700 mil presos no Brasil. Se todas as iniciativas das religiões associadas com os programas educacionais dos governos federal e estadual recuperar somente 1%, são SETE MIL pessoas a ressocializadas que, por sua vez, podem inibir que as próximas gerações partam também para a criminalidade.

Isso sem contar que, se essas ações estão conseguindo ressocializar, a tendência é que melhorem, afinal elas também trabalham a prevenção.

“Ah Paulo, mas…”

NÃO. Parem com esse “mas”. Vocês estão tentando procurar qualquer coisa para justificar o ódio e a violência que tanto recriminam.

Bandido bom não é bandido morto. Bandido bom é aquele que é julgado pelo crime que cometeu (muitas vezes por culpa de um Estado omisso) e que, agora, além de cumprir a pena, tem o DIREITO de ser ressocializado.

Ah sim, só para nível de informação, eu sou ateu e estou apoiando atitudes dos cristãos. E vocês que são cristãos? Vão mesmo continuar com esse discurso de “matar bandido”? Pensem nisso….

 

 

Paulo Emílio

Pedagogo que tem um diploma de Geografia, adora Nutrição, admira a Sociologia, tem uma queda pelas questões ambientais e, nas horas vagas, gosta de jogar enquanto com um caldinho de feijão verde (sem manteiga, por favor)

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