Rio Grande do Norte, quinta-feira, 25 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 6 de janeiro de 2017

Tempo nosso

postado por Beatriz Madruga

Queria mesmo que vivêssemos um dobro a mais por aqui. Queria uns 200 anos pra nós, 250. Acho o nosso muito ainda pouco, cem anos dá pra pouco, dá pra nada e a gente envelhece e se embrutece e se fragiliza muito rápido, sem que se perceba que tudo segue e acaba tão rápido. Acaba tão rápido.

O dobro do tempo daria para ter avós por mais tempo, bisavós e outros velhos por perto. Mais cabelos brancos e sorrisos antigos fariam as almas da gente melhores, sei disso. Daria para ter mais sonhos e mais chances de mudar de curso, de profissão, de tentar e errar. Daria para errar mais sem sofrer tanto, e pra arriscar mais com medo quase zero de errar e achar que o tempo passou. Também seria possível ter menos arrependimentos que terminassem com a frase-ideia de que o tempo certo já se foi.

Aí tornaria possível chegar perto de ler todos os livros que se quer ao longo da vida – agora, sim, longa o suficiente. Veríamos mais filmes e reveríamos filmes e livros e peças. Repetir o prazer seria mais frequente, em muitos aspectos.

Viajaríamos o dobro ou triplo, com mais tempo para juntar dinheiro o suficiente e planejar demais ou de menos. Repetiríamos lugares e viagens, espaços mesmos com décadas de diferença entre eles. Ou século. Viajaríamos por lugares e também pelo tempo, sim, seria melhor.

Haveria mais coragens em nós, no mundo todo, mais disposição em fazer o que se quer e coragem para abraçar o mundo bom com as pernas e braços. Acho que haver mais tempo nos deixaria menos ansiosos, menos corridos, menos acelerados, menos frustrados e tão putos conosco como andamos sendo. Como só sabemos ser.

Teríamos os amigos por mais décadas, mais cervejas e abraços para dividir e caber entre nós, teríamos um tempo longo de vida viva com menos despedidas, como tem sido. As despedidas definitivas aumentam à medida que envelhecemos-embrutecemos-fragilizamos, aumentam na mesma proporção em que nos tornamos conformados – e envelhecidos, brutos, frágeis, frustrados e desistidos de tanta coisa.

Queria um tempo a mais pra gente, um tempo mais entre nós todos por aqui.

Beatriz Madruga

Bia formou-se em Psicologia, mas até hoje não sabe por quê. É estudante de Letras. Prefere ler e escrever a conversar. Em 2015, publicou "Aos Pedaços, Com Tudo" pela Jovens Escribas.

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