Rio Grande do Norte, terça-feira, 19 de março de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 21 de setembro de 2018

Propaganda de rádio e televisão e decisão do voto

postado por Carta Potiguar

Por Homero Costa – Cientista político e professor da UFRN

 

Em 1997 foi publicado um artigo na revista Opinião Pública (Unicamp/SP) intitulado Estratégias de persuasão eleitoral: uma proposta metodológica para o estudo da propaganda eleitoral de Marcus Figueiredo, então professor do IUPERJ e os doutorandos Alessandra Aldé, Heloísa Dias e Vladimyr L. Jorge no qual analisam as estratégias de persuasão eleitoral utilizadas nas campanhas para as prefeituras do Rio de Janeiro e de São Paulo em 1996. Na revisão da literatura sobre o tema, afirmam que os estudos sobre a influência direta da comunicação e da propaganda política em processos eleitorais “apontaram e consolidaram algumas teorias sobre a não passividade dos eleitores, isto é, sobre as motivações psicológicas, políticas e econômicas dos eleitores no processo de aceitação, rejeição e de influência na condução estratégica de campanhas”.

O comportamento eleitoral e a propaganda política devem ser compreendidos como um processo com três componentes essenciais: partidos, candidatos e eleitores. Até meados dos anos 1990 os estudos sobre as eleições ocupavam-se principalmente em estudar os correlatos sociais com as intenções de voto, preferências partidárias e os partidos políticos, mas não as estratégias políticas dos candidatos e dos partidos.

Foi este o objetivo da pesquisa, limitada a duas capitais do sul do país: Rio de Janeiro e São Paulo numa determinada eleição (1996). Embora os resultados apontassem para a importância das estratégias de candidatos e partidos, não se fez pesquisa sobre o eleitorado, ou seja, como os eleitores reagem a estas estratégias. De qualquer forma, ainda é enorme a controvérsia na literatura internacional sobre os efeitos da propaganda política na produção dos resultados eleitorais e  as perguntas que nortearam a pesquisa continuam atuais: “Por que alguns candidatos desconhecidos do eleitorado empolgam e até ganham eleições? Por que outros, conhecidos e bem avaliados, perdem eleições? Por que candidatos largam na frente nas pesquisas de intenção de voto e perdem eleições”?

Não há – como não havia naquele momento – uma única resposta. São vários fatores e analisar as estratégias comunicativas das candidaturas, como fizeram os autores, é apenas uma delas. Outra seria saber quais são de fato, as razões que levam as pessoas a votarem (ou não) em determinado (a)s candidato (a)s.

Uma possível resposta pode ser os efeitos da propaganda de rádio e principalmente da televisão. A lei em vigor que regula a propaganda eleitoral no rádio e na televisão (Lei nº 9.504) foi aprovada em 1997 (30/9/1997) no Congresso Nacional e nestes 21 anos, muitas pesquisas foram realizadas e muitos estudos publicados procurando compreender quais foram de fato as suas contribuições para a decisão do voto.

Depois de 1989, com a vitória de Fernando Collor na eleição presidencial, foram publicados vários estudos destacando o êxito do marketing, no qual o candidato, com uma competente equipe, utilizou pesquisas quantitativas e qualitativas de forma eficaz na sua estratégia e convenceu a maioria do eleitorado. Evidentemente, que não foi apenas o uso do marketing: estavam associados ao contexto, os desgastes do governo Sarney – que Collor usou com muita habilidade – o apoio de grande mídia (Rede Globo à frente), o antilulismo – que também naquele momento, como agora, estava presente em setores da sociedade, etc. Ou seja, outros fatores contribuíram para o êxito do desempenho performático de Fernando Collor e o uso dos programas eleitorais na formação das intenções de voto foi apenas um deles.

Passados mais de 20 anos, houve alteração da contribuição da propaganda de rádio e televisão para a decisão do voto? Para as eleições proporcionais, como se sabe, o efeito é quase nulo. Não há tempo. Para a maioria, mal dá para repetir o nome, número e algum slogan. Já para as eleições presidenciais, a expectativa é que surta efeito positivo. Vejamos.

São 13 candidatos com o tempo variando de 5 minutos e 32 segundos (por bloco) da coligação PSDB, PRB, PP, PTB, PR, PPS e PSD a 5 segundos para João Goulart Filho do PPL e Vera Lucia do PSTU. Os demais distribuídos proporcionalmente às bancadas dos partidos e/ou coligações.  PT/PC do B e Pros com 2 minutos e 23 segundos, Henrique Meirelles do MDB/PHS com 1 minuto e 55 segundos e os demais com menos de um minuto: Álvaro Dias do Podemos/ PSC/ PTC e PRP com 40 segundos, Ciro Gomes do PDT/Avante com 38 segundos, Marina Silva, da Rede/PV com 21 segundos, Guilherme Boulos do Psol/PCB com 13 e 8 segundos para Cabo Daciolo, do Patriota, Eymael da DC e Jair Bolsonaro do PSL e 5 segundos para João Amoêdo, do Novo.

No dia 26 de agosto de 2018, o candidato do PSDB Geraldo Alckmin afirmou que não estava preocupado com a sua colocação nas pesquisas de intenção de voto porque a campanha se iniciava efetivamente com o início do horário eleitoral. A expectativa era de crescimento, afinal teria o maior tempo.

              No entanto, o resultado de sucessivas pesquisas mostrou que pouco contribuiu nas intenções de voto. Geraldo Alckmin se manteve praticamente nos mesmos patamares de intenção de voto de antes do inicio do horário eleitoral de rádio e televisão e Jair Bolsonaro, com apenas 8 segundos, cresceu, assim como Fernando Haddad, que proporcionalmente foi o que mais cresceu desde o anúncio oficial de sua candidatura à presidência com a impossibilidade da candidatura do até então líder inconteste de todas as pesquisas: Luiz Inácio Lula da Silva. Entre o anúncio oficial no dia 11 de setembro e a pesquisa Datafolha de 18 de setembro, ele cresceu 11%, passou de 8% para 19%.

Uma possível resposta em relação ao pouco impacto do horário eleitoral é que uma parcela expressiva do eleitorado não tem interesse em assistir.  Uma pesquisa divulgada no dia 12 de setembro de 2018 pelo Instituto Datafolha mostrou que quase metade (49%) dos eleitores não tem nenhum interesse pelo horário eleitoral dos candidatos a presidente na TV, e os demais se dividem entre quem tem muito interesse (18%), um pouco de interesse (32%) ou não opinaram sobre o tema (1%).

No caso de Fernando Haddad muito mais importante para sua ascensão nas pesquisas é a capacidade de transferência de votos de Lula do que o êxito da propaganda de rádio e televisão. Embora, saliente-se, que a televisão foi considerada na pesquisa como o principal meio de informação: 35% declararam se informar pelos programas jornalísticos da TV, 28%, por meio do horário eleitoral exibido na TV, 22%, via notícias em sites de jornais ou de revistas e 21%, via notícias no Facebook, site do candidato (16%), notícias no WhatsApp (11%), programas jornalísticos no rádio (10%), jornais impressos (9%), horário eleitoral no rádio (7%), notícias no Instagram (5%), notícias em revistas impressas (4%) e notícias no Twitter (3%).

Mas uma coisa são os programas jornalísticos na televisão, outra, muito diferente, são os programas eleitorais de partidos e candidatos.  No caso do rádio, segundo a pesquisa apenas 7% se informam através dele.

Thomas M. Holbrook, professor de Ciência Política da Universidade de  Wisconsin-Milwaukee, especialista em comportamento político, campanhas e eleições nos Estados Unidos,  publicou em 1996 o artigo  Reading the Political Tea Leaves: a Forecasting Model of Contemporary Presidential Elections, na revista American Politics Quarterly (n. 24) no qual formulou o que chamou de modelo de previsão de eleições presidenciais contemporâneas. Entre outros aspectos, o autor analisa a  natureza do impacto da propaganda política e dos debates eleitorais nos Estados Unidos entre partidos e candidatos  e como isso pode repercutir na vontade do eleitor.

Uma de suas principais conclusões é que há uma interação de vários fatores, como o contexto sócio-econômico, denúncias (e/ou calúnias) contra candidato(a)s, acontecimentos imprevisíveis etc., que podem influenciar o eleitorado.                   No que diz respeito  especificamente à propaganda de rádio e televisão no Brasil  a questão é: qual a sua importância para a decisão do voto? Em que momento do processo eleitoral, como e porque a propaganda política contribui para esta decisão? Em que medida o voto é influenciado pelas estratégias de propaganda dos partidos e candidatos envolvidos no processo eleitoral, especialmente com o horário eleitoral no rádio e televisão?

Não é uma resposta fácil e que certamente exige pesquisas e metodologias adequadas.  Thomas Holdrook, no citado artigo, se refere à complexidade desse processo. Numa campanha eleitoral, vários fatores contribuem para o chamado ambiente comunicacional no qual se insere.  Há  os que são  inerentes ao processo eleitoral, como as alianças ou coligações, escolhas de candidatos, comícios, etc., e outros como denúncias contra candidatos, um desastre natural que possa ter sido mal administrado,  um atentado contra um candidato etc., que pode alterar mais a intenção de voto do que os efeitos da propaganda de rádio e televisão (podendo inclusive, nesse caso, ser usado e distorcido por eles).

Em relação às eleições de outubro de 2018 e o horário eleitoral de rádio e televisão, em particular, o que se pode constatar até o momento, em função dos resultados das pesquisas de diferentes institutos, é que pouco alterou as intenções de voto. Para quem já se decidiu, nem os debates, uso de redes sociais, sites de candidatos, entrevistas ou propaganda conseguiram alterar, pelo menos substancialmente, a decisão do voto. Resta saber, a poucos dias da eleição, se surtirá algum efeito entre os indecisos. E estes são, neste momento, pelos índices constatados nas pesquisas, de fundamental importância nas eleições e, portanto,  decisivos no processo de escolha dos candidatos.

 

 

 

 

 

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