Rio Grande do Norte, quarta-feira, 15 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 5 de outubro de 2010

Por que as pesquisas falham?

postado por Daniel Menezes

Os institutos parecem estar vivendo um inferno astral. Suas pesquisas não se aproximaram do resultado saído das urnas. Em alguns casos, como foi com o Start, a disparidade chegou a mais de 10%. Este cenário, sem dúvida, alimenta todo um imaginário já existente com relação às sondagens eleitorais.

A depreciação do papel das sondagens eleitorais é tão forte que há quem aproveite a situação, inclusive, para propor a proibição da publicação dos levantamentos. Esquecem de perceber que o direito a informação é uma clausula pétrea constitucional em nosso país.

No entanto, esta visão com relação às pesquisas nem vem de hoje. Têm raízes profundas. O status negativo que goza as pesquisas eleitorais está intrinsecamente ligado a maneira como as sondagens foram tratadas na época da ditadura. Os militares, constrangidos com a divulgação dos baixos índices dos seus candidatos, empreenderam um conjunto de ações com o intuito de deslegitimar os levantamentos. Todo o prestígio inicial das pesquisas eleitorais, que chegaram no Brasil com o prestígio de já terem acertado vários resultados nos EUA e a improvável vitória do partido trabalhista inglês na década de 40, se esvaiu. Os militares, não apenas dificultaram a publicação das pesquisas, como também difundiram a noção de que os institutos sempre estavam atrelados a interesses obscuros.

O resultado foi à produção de uma legislação regulamentadora das pesquisas, mesmo depois do processo de democratização, extremamente retrógrada e que cria barreiras contra a produção de informação na sociedade. O fato concreto, em suma, é que a proibição da veiculação das sondagens não irá resolver o problema. Ao invés de propor a sua extinção, é relevante discutir as razões do seu (não) poder preditivo.

E para estabelecer um diálogo frutífero deve-se, antes de mais nada, afastar a visão conspiratória do mundo. Há institutos que se corrompem? Eles existem sim! Inúmeras artimanhas são largamente empregadas neste sentido: retirar o quantum de imparcialidade das perguntas do questionário e quebrar a proporcionalidade da amostra quanto ao tamanho das regiões e/ou das classes sociais estão entre as “estratégias” mais utilizadas. No entanto, assim como em outras áreas da sociedade, existem bons pesquisadores e outros ruins.
Outra questão a ser enfatizada é que a pesquisa é uma “fotografia do momento”. Ela apresenta a composição de um cenário. E não é incomum, principalmente com a internet e a rápida circulação da informação, surgir correntes de opinião que alterem rapidamente o arranjo eleitoral inicialmente capturado pelo levantamento. Com isso, deve-se entender que, por mais que a pesquisa seja eficiente, ela irá chegar com um determinado déficit de tempo. Não é possível sondar antes que um fenômeno social já tenha gerado todas as suas conseqüências e se torne conhecido. É como querer fechar a gaveta com a chave dentro.

A “onda verde” capitaneada por Marina Silva, em âmbito nacional, figura como um bom exemplo. Praticamente todos os institutos nacionais erraram porque não conseguiram apreender a migração de votos da candidata Dilma para a concorrente do PV. Ações e opiniões subterrâneas só foram aparecer com a abertura das urnas.

O resultado no RN também apresentou surpresas. Todos os institutos erraram o resultado para governador na capital do estado. Eles davam como certa a vitória de Carlos Eduardo sobre Iberê em Natal. No entanto, foi notório que a polarização entre Iberê e Rosalba, aliado a um gigantesco trabalho do candidato do PSB, enchendo as ruas da cidade de bandeiras, de decoração, a caixa telefônica das pessoas de mensagens sugestivas, além de outras iniciativas, trouxeram um resultado mais favorável para o atual governador entre o eleitorado da capital. As atividades dos últimos dias de campanha projetaram Iberê positivamente, fazendo com que as sondagens não conseguissem constatar o seu aumento.

Nos dois casos as pesquisas se mostraram incapazes porque simplesmente a operacionalização da sondagem eleitoral e de opinião tem limitações objetivas. Não se trata de tentar encontrar um pesquisador que se vendeu, ou um instituto que não soube operar a metodologia corretamente empregada. A explicação é bem mais complexa e exige raciocínio analítico e não suposições fantasmagóricas.

Mas como melhorar a relação dos levantamentos com a sociedade? Duas ações podem ser efetivamente propostas para minimizar os limites e possíveis inconvenientes das pesquisas. É imprescindível, primeiro, permitir que mais institutos produzam sondagens, pois assim o poder de tentar forjar realidades vai estar mais fortemente distribuído e não ficará nas mãos de poucas empresas. O poder controlador da competição entre as várias pesquisas irá, com o passar do tempo, manter os bons e retirar os ruins do mercado. Em Natal mesmo já há institutos, antes famosos, que perderam totalmente a credibilidade e suas pesquisas já viraram motivo de piada.

E é também importantíssimo conscientizar a população sobre as reais possibilidades dos levantamentos eleitorais. A sondagem eleitoral projeta perspectivas. Não advinha o que vai acontecer. Neste sentido, não poderemos mais ficar a mercê do profissional que diz já saber o futuro, como também não é possível abrir mão do direito a informação que a pesquisa promove.

Daniel Menezes

Cientista Político. Doutor em ciências sociais (UFRN). Professor substituto da UFRN. Diretor do Instituto Seta de Pesquisas de opinião e Eleitoral. Autor do Livro: pesquisa de opinião e eleitoral: teoria e prática. Editor da Revista Carta Potiguar. Twitter: @DanielMenezesCP Email: dmcartapotiguar@gmail.com

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