Rio Grande do Norte, sábado, 27 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 19 de setembro de 2021

Vigiai: as Grandes Guerras se aproximam

postado por Joao Paulo Rodrigues

Acerca de sua vinda, Jesus exorta que todos fiquem alertas e atentos; determina que devem vigiar e orar, porque ele virá como um assaltante, na calada da noite. Esse conselho também serve para todas as pessoas não brancas e brancos antirracistas: estejais vigilantes, porque não sabeis nem o dia nem a hora em que os racistas atacarão a ti e a teus irmãos!

Definitivamente, o crime compensa no Brasil, porém, depende da cor. A “Justiça” brasileira tem um jeito todo especial de tratar os brancos ricos racistas. no último dia 11 de setembro, de 2021, os racistas André Diogo Barbosa e Alberan de Freitas Epifânio – este último é um conhecido comerciante bolsonarista – torturaram um jovem quilombola de 23 anos em praça pública. Sim, eles fizeram com o jovem negro o mesmo que fizeram com seus ancestrais, quando os expunham nos pelourinhos, lhes marcando os corpos e as almas com chicotadas e com humilhações.

 Alberan foi capturado em 17 do mesmo mês, todavia, foi solto no dia seguinte, por meio do despacho da juíza Mônica Maria Andrade, que absurdamente entendeu que ele não oferecia perigo para a sociedade – ainda que o criminoso tenha confessado, em áudio tornado público, que cometeu o crime e o cometeria de novo. A juíza simplesmente ignorou que o criminoso já tem uma denúncia de injúria racial contra si. Bem, se esse indivíduo não representa um perigo para a comunidade, sobretudo, negra, eu já não entendo mais nada do mundo da vida.

A forma especial com a qual a “Justiça” trata os racistas é diferente, né? Agora, me diga você: compensa, ou não, o cometimento de crime de racismo e injúria racial no Brasil? Não se constranja, eu respondo: compensa e muito.

Desnecessário dizer que não ignoramos o enredo sobre o qual se deu a contenção seguida de tortura do preto em questão. Não podemos aceitar, em hipótese alguma, que uma pessoa preta seja tratada como se uma escrava fosse. Independentemente de seu erro e eventual contravenção, JAMAIS, JAMAIS pode-se tratar uma pessoa como uma escrava. Não admitiremos que esse retrocesso se estabilize novamente em nossa nação!

Permitam-me dar outro exemplo do quão compensadora é a prática de crime no Brasil, desde que você seja uma pessoa branca racista – se for rica, melhor ainda para você!

No mesmo dia em que Alberan foi preso – para ser solto logo em seguida! –, um vídeo monstra um sargento aposentado da PMSC sendo abjetamente racista. No vídeo, Helio Martins, além de ameaçar agredir a mulher negra que grava o vídeo, enfatiza que não suporta negros.

A Polícia Civil de Santa Cataria está “investigando” se houve os crimes de racismo e injúria racial. Para quem conhece minimamente as leis nacionais – ou faz uma pesquisa na internet –, é óbvio que no vídeo há o cometimento dos crimes de racismo (Lei nº 7.716, de 1989: Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa) e injúria racial (Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: § 3 o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003). Pena – reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)).

Agora, diga-me você, é possível, ou não, encontrar injúrias raciais direcionadas à pessoa que grava o vídeo? Há, ou não, a verbalização de ofensas a todas as pessoas negras, por parte de Helio, constituindo-se, portanto, crime de ofensa ao coletivo? Não sou formado em Direito, assim como também não sou idiota! Tanto é, que não tenho a menor ilusão acerca das consequências e desdobramentos. Possivelmente, decretar-se-á a prisão de Helio – sem dúvida alguma, motivada pela repercussão midiática –, para soltá-lo, quem sabe, no dia seguinte.

Esses foram somente dois casos citados por mim, sobretudo, porque vieram ao conhecimento da grande mídia, em âmbito nacional. Entretanto, não é raro vermos e sabermos de episódios racistas análogos aos casos mencionados. Não tenham dúvidas, os racistas se sentiram mais à vontade depois que o país elegeu um presidente que é, à luz do dia., igualmente racista.

Por isso, irmãos e irmãs, permaneçamos alertas, para que não sejamos apanhados de surpresa – o que faz o sucesso do roubo é o assalto, que é o elemento (da) surpresa da ação. Com isso quero dizer, explicitamente, que devemos cuidar para combatermos fisicamente todo assédio racista, bem como toda sorte de discurso discriminatório. Os racistas precisam entender que encontrarão forças de resistência, senão, sentir-se-ão à vontade para praticar suas barbaridades.

Irmãos e irmãs (negros, indígenas e brancos antirracistas), tenhamos ciência de que somente a força contém a força. O limite do diálogo é a prática do racismo. Ao que parece, os racistas estão, por um lado, sentindo medo de nosso levante social – pois, além de maioria demográfica, estamos nos organizando como nunca antes –, e por outro, estão agindo violentamente porque têm um presidente que endossa suas práticas, de modo a legitimá-las.

Não devemos nos iludir, “Justiça” alguma nos protegerá. Ela já tem seus patrões. É tudo muito óbvio também: o Senado é cheio de gente branca rica (latifundiários e empresários brancos, em sua maioria, com a a média de idade que varia entre 40 e 60 anos), que submete a oitivas os indicados ao Supremo Tribunal Federal e à Procuradoria Geral da República (ambos compostos por pessoas brancas). .

O Congresso (Câmara e Senado), abóboda celeste do regime democrático – que é composta por pessoas brancas, cis, homens e ricas –, diz o que é crime e o que não é. Eles fazem leis de aplicação duríssimas contra as liberdades individuais, como o uso de drogas, e crimes de baixo agravo às pessoas, ao passo que fazem leis brandíssimas contra os crimes que envolvem corrupção, peculato e prevaricação – ilícitos praticados e cultivados por brancos ricos.

Todavia, pergunta-se: por que essas leis têm essa lógica? Porque eles querem se proteger duplamente: por um lado, mantêm as cadeias lotadas, a ponto de evitar que as pessoas não brancas se rebelem, assim como tentam manter suas propriedades livres de legítimos saques e invasões; por outro lado, se eventualmente forem presos – uma exceção raríssima, que só se dá com alguma finalidade escusa: caso Lula –, não passarão muito tempo na cadeia. Isto é, se forem presos efetivamente, provavelmente irão para prisão domiciliar, haja vista que eles conhecem os juízes, os quais são, às vezes, padrinhos de seus casamentos ou de suas filhas. Nada faz sentido, certo? Ou faz!

Os juízes e promotores são pessoas brancas, que tiveram sucesso na vida porque tiveram todas as condições adequadas para tanto. Eles pouco se importam com a realidade em que os pretos são maioria nos presídios e que estas prisões são, em boa parte delas, motivadas por questões de gravidade menor.

Na ponta, lá na ponta, há os policiais. Mas, até entre estes há uma diferenciação: se forem militares, a maioria são pretos, se forem civis e federais, a maioria são brancos – além disso, os postos mais altos das corporações policiais estão destinados aos brancos. No fim das contas, pretos caçam pretos, como nos tempos sombrios da escravidão. Quando não é isso, temos um indivíduo como Helio apavorando pessoas pretas à rua, somente para mitigar sua sede por sangue negro – não se enganem: a barbárie tem cor, e ela é BRANCA! –, sob a proteção da farda militar.

Ou seja, estamos sós, queridos irmãos e irmãos. Sós! Temos de nos unir contra tudo e contra todos que querem nossa morte. Convenhamos, idoso, adulto, jovem e adolescente, todos sabem que a polícia não é confiável. Então, não espere nada dessa gente. Procuremos nos unir cada vez mais em laços de solidariedade.

Protejamos nossas famílias dos devoradores brancos. Eles são espíritos malignos, que tiram nossas pazes e nossas vidas. Não deixemos que um irmão de cor e de luta caia humilhado diante de um branco racista. Tenha certeza, seu erro não é suficiente para colocá-lo na condição de escravizado – nenhum erro o é!. Tenham certeza, irmãos, nossa JUSTIÇA é melhor que a deles. Eles querem eliminar nossas vidas, nós queremos simplesmente viver – o princípio é totalmente diferente!

Vigiai, irmandade, pois Grandes Guerras se aproximam. Cuidemos para que não nos massacrem, como assim fizeram aos nossos ancestrais. Os racistas agem por medo de perder o privilégio, nós devemos agir porque não temos nada a perder. Não nos enganemos: não há vida digna desacompanhada de liberdade; viver a humilhação do jugo da escravidão – ainda que analogamente – não é aceitável. Nossa liberdade não está à venda; não negociamos nossas vidas!

Enquanto a Novo Quilombo não desce do Céu, nos protejamos na Cidade Negra, que é espiritual e construída por nossa solidariedade. Não esqueçamos: se eles querem nossos corpos, só os terão quando estivermos mortos!

E, lembrem-se: não aceitem racistas, nunca andem sós, jamais aceitem covardias! Negros, indígenas e brancos antirracistas, uni-vos contra as hostes do mal, que hasteiam o caos!

Joao Paulo Rodrigues

Graduado, especialista, mestre e doutorando em Filosofia (UFRN). Especializando em Literatura e Ensino (IFRN) e curioso pela ciência da grafodocumentoscopia.

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