Rio Grande do Norte, domingo, 05 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 3 de fevereiro de 2013

Por um Brasil decente. Mas para quem?

postado por Daniel Menezes

A professora Marilena Chauí nos ensinou que o discurso ideológico é sempre lacunar. Não se trata de uma mera falsificação dos fatos. Ele carrega um elemento de realidade que se alia a aspectos “não-ditos”, tornando sua base argumentativa verossímil.

img_senado_rampa_manifestantes_anticorrupcaoA ênfase num “país decente”, na forma como vem sendo feita pelo conservadorismo, serve como um bom exemplo daquilo que a filósofa apresentou em suas obras. É aparentemente inquestionável ser a favor da moralização da política. Afinal, quem não é contra a corrupção? No entanto, o discurso perde sua evidência quando se procura ultrapassar às bordas e qualificar os interesses opacos em jogo.

A defesa da decência na chamada vida pública parte do pressuposto de que o problema do Brasil é o da corrupção. Mais. Estabelece um pano de fundo em que o país do futebol, local privilegiado da malandragem – quantos livros o midiático antropólogo Roberto Damatta vendeu floreando este preconceito com suas artimanhas escolásticas? -, é comparado a uma versão idealizada do “primeiro mundo”, aonde tudo funciona.

Nessa lógica, a desigualdade se torna algo secundário. Pior. Tudo se transforma numa questão do bom emprego dos recursos arrecadados na forma de impostos. Portanto, basta colocar alguém dotado de uma moral superior no poder para tudo caminhar corretamente. O eleito, alçado a condição de salvador da pátria, não precisa explicitar sua agenda política, enfrentar contradições sociais e antagonismos de classe.

Essa cantilena nos deu Jânio Quadros, ajudou a legitimar o golpe militar de 1964, trouxe o caçador de marajás, todos com uma ideia clara: construir um Brasil decente… para os filhos da casa-grande. Uma limpeza da política conjugada a um cenário supostamente meritocrático em que, na verdade, uma minoria parte pilotando uma ferrari e a grande maioria compete na sela de um jumento e é responsabilizada pelo resultado da disputa. Enfim, surge um mundo legitimado sem espaço para Bolsa Família, programa de cotas nas universidades públicas para negros e pobres, combate da homofobia, do racismo.

O topo da pirâmide social e a classe média tradicional, que olha mais para cima do que para baixo, dormem em paz com a certeza de que representam o que resta de bom nesse mundo degradado.

Daniel Menezes

Cientista Político. Doutor em ciências sociais (UFRN). Professor substituto da UFRN. Diretor do Instituto Seta de Pesquisas de opinião e Eleitoral. Autor do Livro: pesquisa de opinião e eleitoral: teoria e prática. Editor da Revista Carta Potiguar. Twitter: @DanielMenezesCP Email: dmcartapotiguar@gmail.com

One Response

  1. Lucas disse:

    Daniel discordo de alguns pontos de seus argumentos, o combate a corrupção se faz sim necessario no Brasil, afinal esse ainda é o fator principal dos problemas do Brasil, concordo que honestidade nao é virtude, nao passa de mera obrigação de cada um de nós, a melhor forma de se construir uma sociedade mais igual é com politicos que desenvolvam boas politicas publicas, e nao tao somente com honestidade, mas temos que encarar que boas politicas publicas nao serao acessiveis, se as verbas para a implementação delas forem sempre desviadas durante a longa jornada que o dinheiro de nossos impostos tem que percorrer antes de chegar ao povo, quantos brasileiros nao deixam de ter acesso a educação porque a verba foi desviada, o sus é considerado um modelo de saude publica para o mundo, mas por que nao funciona? porque suas verbas sao desviadas, e posso citar varios outros exemplos onde nao é a politica publica que foi ruim, o problema foi o desvio da verba que atrapalhou. Se hoje temos serviços publicos sucateados, nunca foi por falta de dinheiro e sim pelos desvios.

    Outra coisa, melhor muito melhor que cotas e bolsa familia, seria uma escola publica de qualidade, que desse essa igualdade a todos, e nao deixar a sociedade dependente de cotas e bolsas familias, que alias nao trazem essa tao propalada igualdade que voce citou, e que alias nao passam de uma forma do pt corromper e enganar a sociedade, haja visto que em varias eleições o pt usou como tatica o medo de que outros partidos vencendo acabariam com essas politicas. O Brasil nem essa parcela da sociedade pode ficar eternamente dependente dessas bolsas e cotas, e nao vejo nenhuma ação no sentido de melhorar de fato a educação no Brasil.

    É muito razo achar que so a falta de boas politicas é que justificam nosso atraso, alias é um argumento perigoso, pois senao, dessa forma voce atesta que o rouba mas faz vale a pena, atesta que o mensalao, onde os fins justificam os meios, foi um esquema que faria sentido. Temos sim que ter boas politicas, mas sem corrupção.

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