Rio Grande do Norte, quarta-feira, 15 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 18 de setembro de 2013

A Cronologia da Batalha: Crônicas da Greve da PCRN

postado por Ivenio Hermes
Por Ivenio Hermes, Marcos Dionisio e Cezar Alves

(Publicado originalmente no Jornal De Fato, Coluna Retratos do Oeste)

Desde sexta-feira que o Governo do Estado não apresenta nenhuma proposta concreta aos policiais civis, pelo contrário, utiliza de artifícios como trancar portas, acorrentar entradas, convocar policiais militares para blindarem a sede do governo e subliminarmente promovem a divulgação de falácias que ameaçam os grevistas

PaperArtist_2013-09-16_15-52-21O Tempo

Rosalba Ciarlini, Governadora do Estado do Rio Grande do Norte e Aldair da Rocha, Secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, estariam em uma reunião fechada na manhã desta segunda-feira debatendo as reivindicações dos Policiais Civis do RN. Contudo, uma Nota de esclarecimento com relação à greve dos policiais civis e escrivães estava veiculada desde 9h31 desta manhã, isto é, enquanto a suposta conversa acontecia, um texto cuidadosamente elaborado já estava pronto para ser divulgado para imprensa.

Uma controversa cronologia se estabeleceu nesses acontecimentos informados à imprensa:

  1. A notícia da reunião foi dada pelo jornal A Tribuna do Norte às 10h53min, informando inclusive que não tinha hora para acabar (veja em http://db.tt/Gkt8JWcg);
  2. Foi publicado no site oficial do Governo do RN às 9h31min, antes da reunião terminar e antes da divulgação pela imprensa (veja em http://db.tt/zznvgila);
  3. Novamente a Tribuna do Norte sai na frente divulgando a nota que foi dada à imprensa, às 13h00, só que fora a mesma informação que estava disponível desde 9h31min (veja em http://db.tt/G3Q9jKpe).

Esse equívoco cronológico não é o único que a Administração Ciarlini está cometendo, entretanto, serve para que a sociedade potiguar possa adotar um posicionamento acerca dos fatos que vem sendo disseminados sobre a uma das maiores greves de policiais já enfrentada pelo Estado.

Ao contrário do que foi dito na nota, o Governo do RN não está aberto às negociações, não tem buscado atender as pautas negociadas pelos policiais civis e portanto, não está empenhando todos os esforços para encerrar a greve dos agentes e escrivãs.

A própria Comissão criada por representantes da OAB, do Conselho de Direitos Humanos e da Assembleia Legislativa cansados de aguardarem na companhia do Secretário Aldair Rocha da resposta dos ocupantes do Castelo de Ar Acorrentado, retirou-se do processo de negociação na Sexta-feira em face da deselegância e incivilidade do Governo do Estado que ali, reinaugurara sua pedagogia autoritária que tentou sedimentar quando em 22 de dezembro de 2011 editara decreto estadual vedando manifestações no âmbito do centro Administrativo, episódio que ficou conhecido como AI-5 de Rosalba.

Nas três reuniões, sendo uma delas só ocorrendo por iniciativa da Secretária Nacional de Segurança Pública, Regina Miki, o Governo do Estado recebeu a comissão, porém não apresentou propostas cabíveis dentro do parâmetro de negociação e nem que atendessem à viabilização do Projeto Brasil Mais Seguro no Estado, deixando o Sindicato dos Policiais Civis e Servidores da Segurança Pública do Rio Grande do Norte e ITEP sem condições de ter qualquer meio de entendimento. Descumpriu, inclusive, o compromisso assumido de assegurar a presença da equipe econômica nas reuniões, tendo até um inadvertido participante ao se dirigir a SEPLAN tido acesso a uma conversa na qual se dizia que aquele órgão não havia sido convocado pelo Gabinete Civil para acompanhar as tratativas.

PaperArtist_2013-09-16_15-49-48O Deus da Guerra

Na última sexta-feira (13/09) quando seria a quarta reunião de negociação, não foram os veículos de som, cruzes e um caixão, que desrespeitaram os canais democráticos, foi a falta de vontade de negociar manifestada pela não aceitação da pauta flexibilizada do SINPOL e as portas fechadas da Governadoria.

Hoje, segunda-feira (16/09), o conjunto onde fica a sede administrativa do Estado já estava sob forte isolamento e manobras de segurança da Polícia Militar, justamente para impedir manifestações como outrora fora tentado pela Governadora, no aludido decreto conforme pode ser lido no artigo Policiais em Rota de Colisão.

Vale lembrar que as pautas dos policiais civis começam com a nomeação dos concursados, passa pela convocação dos suplentes para curso de formação, pede melhores condições de trabalho através de equipamentos, instalações prediais dignas nas delegacias, viaturas próprias para o trabalho, coletes balísticos, armamento e munição e só então chega nas melhores condições salariais.

Portanto, novamente é bom lembrar que esses tópicos estão sendo intransigentemente não negociados pelo Governo do RN.

O Governo do RN dá muita importância à pauta salarial e faz com que pareça que ela é o principal empecilho para o fim da greve, quando não é, levando a sociedade potiguar a crer que o entrave se dá por conta de salários.

A articulação perversa é tão meticulosamente estudada que na Nota Oficial não divulgaram os salários dos delegados, pois eles não estão mais em greve, e nem tampouco informaram que a maior parte dos policiais ganha salários maiores porque já atingiram o topo da progressão funcional, portanto com maiores salários. Desses, 300 estarão em idade de se aposentar em abril de 2014.

Numa polícia que totaliza cerca de 1160 agentes e escrivães, 300 estão no topo da carreira recebendo salários maiores. Ao se aposentarem, esses homens darão lugar aos iniciantes que receberão salários menores e assim a máquina administrativa recebe o refrigério do fluxo de novos agentes.

Os professores e servidores das áreas de saúde deixaram a greve apenas porque conseguiram que o Estado, pelo menos contratassem novos servidores e acenasse para um aumento salarial. O caso dos delegados é diferente, como veremos abaixo.

Como o poderoso Deus da Guerra, Áries, a Administração Ciarlini emprega todos os meios para vencer os policiais civis:

Retirada dos Delegados. Como gestores e tendo poucos no Estado, os delegados sentiram-se menores e foram subjugados pelas pressões internas geradas por outros delegados que eram contra a greve. Divididos e sem nenhuma de suas reivindicações foram atendidas, eles saíram da guerra deixando-a nas mãos dos agentes e escrivães;

Ação Judicial. Com os delegados vencidos, foi uma questão de tempo até que os pontos começassem a ser cortados e houvesse a judicialização da greve, e logo o Tribunal de Justiça entrou em ação determinando o retorno de 70% do efetivo;

Pressão nos Generais. Sendo pressionado pela multa diária de R$ 15 mil e com possíveis repercussões ulteriores para Djair Oliveira e Renata Pimenta, presidente e vice-presidente do SINPOL, a Administração Ciarlini só precisaria protelar as negociações para empurrar os policiais civis cada vez mais para a borda da ilicitude se a greve for declarada ilegal;

Pressão nos Soldados. Com os generais sendo zimbrados, atacar os soldados seria a próxima estratégia de enfraquecimento. Assim, a Administração Ciarlini publicará no Diário Oficial uma portaria determinando o retorno de todos os policiais civis que não estão trabalhando, ou seja, em greve, no prazo máximo de 15 dias, cuja desobediência será ensejadora da abertura de Processo Administrativo Disciplinar por abandono do cargo, cuja punição é a demissão.

O chamamento de novos policiais civis, uma reivindicação do SINPOL, será feito dentro de um planejamento conduzido pessoalmente pela Governadora Rosalba Ciarlini, dentro do programa Brasil Mais Seguro. A Chefe do Executivo já convidou o Ministério Público e o Judiciário para acompanharem o processo.

PaperArtist_2013-09-16_15-51-40Os Sinais

Na realidade potiguar, o SINPOL nunca teve suas reivindicações realmente atendidas:

  • Nem todas as delegacias estão sem presos;
  • Os veículos importados adquiridos para o ITEP estão se estragando por não possuírem peças para manutenção e os equipamento citados na Nota estão em desuso por falta de local apropriado;
  • Aumento de 20 para 42 o número de Comarcas no RN com efetivo da PC, como aumentar comarcas sem aumentar o efetivo policial? Criação da Delegacia de Homicídios em Mossoró, delegacia criada sem contratação de novos policiais, prejudicando o funcionamento das outras;
  • Nomeação de mais de 200 agentes, delegados e escrivãs. Nomeação apenas para compor as vagas geradas por falecimento e aposentadorias;
  • 164 novas viaturas impróprias para o uso na atividade fim para a qual a Polícia Civil foi constitucionalmente criada, ou seja, investigação;
  • 430 coletes à prova de balas sem tamanhos adequados e distribuídos aleatoriamente, simulador de tiros que não tem uso programado, boletim de ocorrência eletrônica para uma polícia que não é informatizada, 01 caminhão baú (qual a finalidade?), duas delegacias móveis (onde está o efetivo para trabalhar nelas?
  • Reforma dos Laboratórios Necrotério de Natal num prédio ameaçado de interdição

Os policiais civis estão sozinhos nessa guerra por melhorias que diretamente beneficiam todos os cidadãos potiguares. As reivindicações do guerreiro Kratus ao Deus Áries nunca foram atendidas, utilizando os lentos passos de Cronus a seu favor, conseguindo inclusive o apoio dos habitantes de Atica, a quem Kratus protegia.

A Governadora Rosalba Ciarlini não esteve presente em nenhuma das negociações, porém afirma que está aberta ao diálogo. Fala em fim de greve, com ordem e respeito, mas não há respeito ao cidadão potiguar e aos próprios policiais civis e servidores do ITEP que também são cidadãos. Cidadãos em luta para amealhar condições de trabalho para ajudar na superação da Impunidade.

Como na sandice do corte linear do orçamento dos outros poderes e órgãos, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte brinca seriamente com os destinos dos potiguares ao não procurar equacionar o conflito que engendrou a greve e com isso incentivar o moto contínuo da impunidade dos crimes que já faz cidadãos intimidados armarem-se da covardia para agredirem quem achado em delito, não havendo um só dia em que não haja notícias de pessoas querendo fazer “justiça” com as próprias mãos. O limiar da porta da barbárie já foi ultrapassado, não subsiste ao governo credibilidade para retomar um mínimo de governança e mesmo sua base aliada foi esvaziada com a saída dos ratos dos porões da Nau da Insensatez em que se converteu a tragédia do Governo Rosalba.

Isolado perante a opinião pública e abandonado pela base de apoio medíocre que o auxiliou a indigitar a mediocridade para todo e sempre no Governo, restará a esse, manifestações explícitas e implícitas de autoritarismo que poderá promover rancores e dores nos potiguares, mas também poderá lhe ser também um atalho para a galeria dos gestores a serem esquecidos pela população no tempo previsto ou antecipadamente por falência múltipla.

Até quando nosso RN será um RIO GRANDE DE MORTE, sem sorte e sem NORTE?

 

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SOBRE OS AUTORES:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar, Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Marcos Dionísio Medeiros Caldas é Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos (RN) e da Coordenação do Comitê Popular Copa 2014 – Natal.

Cezar Alves é Fotojornalista e Editor do Jornal De Fato e da Coluna Retratos do Oeste.

 

 

Ivenio Hermes

Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Integrante do Conselho Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial. Facebook | Twitter | E-mail: falecom@iveniohermes.com | Mais textos deste autor

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