Rio Grande do Norte, sábado, 11 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 22 de setembro de 2013

Escassez de Policiais na Polícia Judiciária do RN: Uma Crônica Inacabada – Pt 02

postado por Ivenio Hermes

Parte 02/02: A Cessão de Policiais e o Impacto Salarial

Embora a Administração Ciarlini, através do Secretário Chefe do Gabinete Civil, afirme que o Estado não possui verba para lidar com o impacto financeiro que a nomeação dos novos concursados causaria à folha mensal de pagamento, o estudo abaixo visa esclarecer que isso não é tão real em face de outros gastos do Estado e demonstra que nunca houve planejamento para a PCRN na atual gestão.

The Dry Land

Por Ivenio Hermes e Cezar Alves

(Publicado originalmente no Jornal De Fato, Coluna Retratos do Oeste)

Em 13 de fevereiro de 2004 foi promulgada a Lei Complementar nº 270 que Dispõe sobre a Lei Orgânica e o Estatuto da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte e, dentre outras providências que ela estabelece, está o número de 5.170 cargos para policiais, discriminando em cerca 4 mil agentes, 800 escrivães e 300 delegados o número de vagas.

Para suprir essas vagas necessárias para que haja a efetiva interiorização da Polícia Civil e a adequação do órgão à demanda do crescimento populacional e do índice de crimes cometidos no Estado, concursos públicos regulares teriam que acontecer.

Nove anos após a LC 270 ter sido publicada, a PCRN continua com um quadro caótico de efetivo, indo na contramão de tudo que foi planejado e pensado há tanto tempo.

O plantel de policiais civis não foi renovado e o Estado do Rio Grande do Norte começou a mostrar aquilo que já acontece em todo Brasil quando se diz que governar é fazer leis e não planejar, causando uma falsa sensação de solução dos problemas. Nesse assunto, Cesar Maia, economista e ex-prefeito do Rio de Janeiro afirmou que esse excesso legislativo ampliava as relações de clientela com parlamentares, parques de diversões para os escritórios de advocacia e riscos de uso de resíduos legais para tempos posteriores.

The Society ClaimersOs novos governos surgem sem estarem cientes das leis vigentes em seu Estado, e assim, a Administração Ciarlini surgiu sem planejar de acordo com a realidade que enfrentaria na segurança pública e antes que a situação descambasse para o caos deixou de atentar para o número de Policiais Civis para prestar um bom serviço à sociedade, e continuou a cometer os mesmos erros dos governos anteriores, catapultando os índices de insegurança para patamares nunca dantes vistos em terras potiguares.

Assim, a cessão de policiais de um órgão que já está sem o número mínimo para trabalhar com presteza e o impacto salarial que a contratação de novos policias acarretaria nunca foram objeto de estudo da Administração de Rosalba Ciarlini.

Essa falta de planejamento estratégico do Governo do Estado levou o Ministério Público do Rio Grande do Norte a enviar uma Recomendação Conjunta à Governadora do Estado, ao Secretário Estadual de Segurança Pública e Defesa Social (SESED) e ao Delegado-Geral de Polícia Civil (DEGEPOL) para que fosse adotada providências para o retorno de todos os policiais civis (delegados, escrivães e agentes) que atualmente se encontram cedidos para outros órgãos públicos.

Esses policiais cedidos cujo número acreditava-se ser em torno de 30, agora chega a 124 policiais civis segundo estudos realizados pelo MPE e corroborado com dados oriundos da própria Polícia Civil.

No caso da cessão de policiais mesmo diante da falta gritante de efetivo, existem delegados, escrivães e agentes que estão, portanto, desviados de sua atividade-fim, o que poderia até configurar desvio de função e talvez por isso o Procurador-Geral de Justiça e o Coordenador do NUCAP inclusive recomendaram que fossem averiguados todos os casos de cessão de policiais civis para outros órgãos, no total 12 órgãos diferentes do de origem.

Outros afastamentos sob cessão cuja averiguação foi recomendada para Governadora, para o Secretário de Segurança do Estado e para o Delegado Geral, foram aqueles de delegados, escrivães e agentes que estão em setores da estrutura desconcentrada da própria SESED, trabalhando em serviços desvinculados da função constitucional e legal de Polícia Civil, para que sejam determinados imediatamente a voltarem para suas funções de origem em detrimento de qualquer ato administrativo em contrário.

Sabedores que o policiamento ostensivo não dá conta de deter a escalada do crime se não houver o prosseguimento da atividade policial de investigação, em suas modalidades diversas como a forense, a cartorária, a de campo e etc., a Administração Ciarlini não parece se preocupar com investimentos na segurança pública em geral, mas é na polícia judiciária que se observa um maior teor de falta de investimentos.

Sem estudos direcionados para o entendimento do que se vai gastar com segurança pública, a Administração Ciarlini se fundamenta no empirismo e na dedução, que desemboca na inexatidão de resultados.

Na tabela abaixo, feita através de um criterioso trabalho de acompanhamento através dos sites oficiais e outras fontes por Francisco Macedo, um dos concursados da Polícia Civil, estudo esse que já foi enviado para a SESED – Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social por solicitação daquela secretaria, pode ser visto como o impacto salarial perde sua importância diante dos valores perceptíveis a serem gastos e, sobretudo, em função do lucro social que as novas contratações gerariam.

Veja a tabela:

Tabela Impacto Financeiro

Atualmente a taxa de desistências (não toma posse, pede final de fila ou pede exoneração) é de 29% para delegados, 25% para agentes e 51% para escrivães, um número extraído de um cálculo matemático que pode facilmente ser realizado pela equipe de planejamento financeiro do Governo do Estado mas que não é feito.

Dos 140 agentes que ainda restam para serem nomeados, 50 já são servidores públicos estaduais e recebem um montante de R$ 126.426,72, isto é, eles apenas mudariam de órgão de lotação gerando um impacto real muito inferior. O mesmo ocorre com os delegados e escrivães, destarte, a expectativa de aumento percentual¹ no gasto da folha de pessoal seria de apenas 0,029%.

The Blood DonnorsConcluindo…

A Administração Ciarlini já recorreu de decisões judiciais antes com relação a Polícia Civil, como a da juíza Patrícia Gondim Moreira Pereira, que determinava a nomeação imediata dos concursados, assim, não será surpresa algum recurso ou forma de protelação dessa Recomendação Conjunta n° 001/2013 – PGJ/NUCAP foi publicada no Diário Oficial do Estado dia 11/09/2013 e abre um prazo de dez dias para que as autoridades recomendadas informem as providências adotadas, inclusive, se acatam ou não a Recomendação, embora o Procurador-Geral de Justiça e o Coordenador do NUCAP alertam não acatar a Recomendação implicará no ajuizamento de ação civil pública por parte do MPE.

A escassez de delegados, agentes e escrivães na Polícia Judiciária do RN ainda não chegou ao fim, é uma crônica inacabada que deixa em suas linhas muitos crimes cujos perpetradores jamais serão descobertos e nem levados à justiça, restando ao cidadão potiguar aguardar que algum milagre aconteça para o salvar.

Com efeito, sem se dar conta da magnitude do problema, a sociedade potiguar, bem como ocorre na brasileira, vive sob o escambo da troca de seus votos por promessas que não são cumpridas.

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SOBRE OS AUTORES:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar, Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Cezar Alves é Fotojornalista e Editor do Jornal De Fato e da Coluna Retratos do Oeste.

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REFERÊNCIAS:

[1] Cálculo com base na receita corrente líquida (RCL) correspondente ao 1º quadrimestre de 2013, segundo a decisão do TCE. A receita corrente líquida referente ao 1º quadrimestre de 2013 foi de R$ 6.524.630.273,84, chegando-se ao valor mensal de R$ 1.631.157.568,46. O montante de R$ 484.141,29, referente ao impacto mensal estimado das nomeações, equivale a 0,029% da receita corrente líquida mensal do primeiro quadrimestre de 2013.

HERMES, Ivenio. O Mito das Nomeações. Blog do Ivenio Hermes. Disponível em < http://migre.me/cpHh3 >. Publicado em 16 jul. 2012.

MAIA, Cesar. Excesso de leis cria insegurança jurídica. In: Consultor Jurídico, Furor legiferante, 05, set 2009. Disponível em: < https://db.tt/lnBo7H3n >. Publicado em 05 set 2009.

HERMES, Ivenio. Convocação de Suplentes da PC Potiguar: Reconhecer enquanto não é tarde! Blog do Ivenio. Disponível em: < http://migre.me/cpHqb >. Publicado em: 22 jul. 2012.

PEREIRA, Patrícia Gondim Moreira. Sentença do Procedimento Ordinário nº: 0801600-08.2011.8.20.0001: Autor: Associação dos Delegados de Polícia Civil do Est do Rn – ADEPOL/RN. Réu: Estado do Rio Grande do Norte. Disponível em: < http://db.tt/EJulJdjM >. Publicado em 18 dez. 2012.

RIBEIRO, Bruno Servello. O Excesso de Leis e sua Inefetividade Social. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 87, abr 2011. Disponível em: < https://db.tt/oDy69sCE >. Publicado em 05 abr. 2011.

Ivenio Hermes

Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Integrante do Conselho Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial. Facebook | Twitter | E-mail: falecom@iveniohermes.com | Mais textos deste autor

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