Rio Grande do Norte, sexta-feira, 03 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 30 de março de 2014

Iminente e Possível Triste Final do Curso de Agente Penitenciário

postado por Ivenio Hermes

Nem todas as forças são eficazes contra a ausência de vontade, mas é preciso lutar. É mister cuidar da esperança.

Por Ivenio Hermes e Marcos Dionisio Medeiros Caldas

Sob a forte periclitação da perda de prazos, algo já costumeiro na Administração Ciarlini, o concurso dos Agentes Penitenciários está perto de ser sentenciado ao esquecimento.

Futuros AgPen

Órfãos da Vontade Estatal

Os concursos públicos no Rio Grande do Norte, em especial os que se destinam ao provimento de vagas no setor da segurança pública, tem sido repetidamente depreciados, fragilizando uma área já tão desgastada, consolidando a descrença da população e sedimentando a imensa sensação de insegurança social. E tratando as entidades que compõe o setor da segurança pública de forma displicente, o Governo do RN parece alheio à mortandade estabelecida no Estado. Sua omissão serve mesmo a um verdadeiro patrocínio dessa Guerra Civil que ceifa vidas continuadamente em terras potiguares, onde guardando direta relação com o tema, sendo que muitas das vítimas e algozes deveriam permanecer sob custódia do chamado Sistema Penitenciário e não aflorarem, como protagonistas da insustentável vida em sociedade padecida nas comunidades periféricas.

O novo secretário de Segurança Pública, Eliéser Monteiro, já efetivado desde sexta-feira (20), veiculou que só “se pronunciará sobre este ou qualquer outro tema, até tomar ciência com mais profundidade de todos os assuntos que envolvem a segurança pública do RN”. Terá muito trabalho, sobretudo, em driblar o boicote interno da Administração Estadual em curso, que não se vale da mesma calculadora que quer nos impor uma crise artificial, para calcular os custos socioeconômicos da violência e a precarização do que resta da dignidade humana na terra de Poti.

Além das Polícias Civis, Militares e do Instituto Técnico-Científico de Polícia, o Sistema Penal que passa por uma situação preocupante, com insuficiência de pessoal para garantir um mínimo de segurança e possibilitar a condução de presos às audiências, e isso sem falar na deficiência em número de vagas para receber novos apenados nas unidades carcerárias. Inúmeras fugas ou tentativas descobertas a tempo de ser evitadas reforça o ambiente insólito.

Nessa matéria, o secretário de Justiça e Cidadania, Júlio César de Queiroz, apresenta pleno conhecimento e tem evidenciado esforços para consolidar meios resolutivos para a problemática carcerária e de efetivo. No caso de vagas para apenados, Júlio já apresentou soluções alternativas para construção e reforma de carceragens, que possibilitariam a criação de vagas para novos apenados, e quanto à contratação de agentes penitenciários, desde que assumiu, ele tem recebido representantes dos agentes e concursados em constantes tratativas para soluções.

Infelizmente, o empenho de um gestor não é o suficiente quando se depara diante da muralha do desinteresse Governamental.

O fato apresentado nas páginas da segurança pública e do acesso à justiça escritas pela atual administração é que, em se tratando de implementar políticas de segurança, nem a população, nem as entidades de classe, nem os órgãos componentes direta e indiretamente do sistema de segurança pública, fazem qualquer leitura de alguma vontade do Governo do RN em deter o tsunami de violência homicida, e os cidadãos potiguares tem se tornado órfãos da vontade do Estado. Não previne, não reprime, nem reforça instituições como a Defensoria que poderia proteger um pouco nosso frágil Estado de Direito. Condena os gestores a administrarem tirando leite de pedra e concentra recursos na área da publicidade oficial, mesmo sem ter obras a apresentar. Ou tendo obras macabras a serem escondidas por trás de filminhos perversos, como aqueles apresentados quando da não leitura da mensagem atual da governante na Assembleia e depois veiculados aqui ou acolá sabe-se lá a que custos e com que propósitos.

Triste Quadro de Vilipêndio

O concurso para provimento de vagas para Agentes Penitenciários previstas no Edital 001/2009-SEARH/SEJUC passou por vários problemas, mas baseado num Termo de Ajustamento de Conduta firmado pela Administração de Rosalba Ciarlini e o MPE, onde havia a previsão de qualificar e contratar mais agentes trouxe nova luz para o tema.

Planejando repor o quadro de servidores, a SEJUC considerou a previsão apresentada no item 15.3 do Edital do Concurso Público nº 001/2009 – SEARH/SEJUC, que permite o Estado do Rio Grande do Norte formar turmas adicionais com base na existência de 27 cargos vagos de Agente Penitenciário, em razão de aposentadorias, exonerações e demissões, definiu o quantitativo de vagas para um novo curso de formação, conforme o texto:

“Considerando que o item 15.3 do Edital do Concurso Público nº 001/2009 – SEARH/SEJUC, faculta ao Estado do Rio Grande do Norte, através da Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania – SEJUC, o direito de formar turma(s) adicional(is), para realização do Curso Específico de Formação Profissional, de acordo com a conveniência da administração e a necessidade de serviço (…)” (PORTARIA Nº 129, de 09 de julho de 2013)

Com a convocação, a esperança reascendeu em 87 candidatos, que se dedicaram integralmente ao curso, mas durante as aulas, os alunos receberam a informação de que só havia previsão de contratação de 30 agentes, que seriam as vagas existentes, e que o Governo não teria intenção em buscar respaldo legal para contratar todos os candidatos que ora participavam do curso, algo que provocou sofrimento e uma desagregadora e desnecessária concorrência interna, levando os alunos a disputar entre eles, desvirtuando a promoção da união e tirando deles o momento de vitória pelo esforço dispensado nas etapas anteriores.

A própria informação de que somente haveria 30 vagas foi desnecessária e duvidosa, pois conforme lista denominada Exonerações de Agentes Penitenciários no RN, existe mais de 40 vagas para agentes penitenciários a serem preenchidas. Veja o quadro abaixo:

Vagas Masculinas

QG AGPEN M

Vagas Femininas

QG AGPEN F

E destarte, o curso de formação passou a ser uma efervescência emocional como uma verdadeira penitencia psicológica que até hoje permanece e agora, com a possibilidade de nem as 30 vagas serem preenchidas, pois já se cogita a negativa do Governo do RN em assinar o TAC, que permitiria a nomeação de alguns agentes penitenciários.

Prazos Perigosos

O silêncio sobre o assunto se parece com outras atitudes do Governo do RN, que vem empurrando a segurança pública com a barriga e sempre buscando bodes expiatórios para culpar pela sua ineficiente administração, como o recente episódio em que em Aldair da Rocha, ex-secretário de Segurança Pública, que defendeu o Governo de Rosalba Ciarlini ferrenhamente, foi atirado à conta do insucesso das ações de segurança pública.

A própria Portaria Nº 129 – SEARH/SEJUC, de 09 de julho de 2013, que convocava os candidatos para o Curso de Formação já alertava para o prazo final de 30 de Abril de 2014, onde se lê:

“Considerando que encontra-se em vigor, até o dia 30/04/2014, o Concurso Público nº 001/2009 – SEARH/SEJUC, nos termos das Portarias nºs 028/2010-GS/SEARH, de 30 de abril de 2010 e 031/2012-GS/SEARH, de 14 de fevereiro de 2012” (PORTARIA Nº 129, de 09 de julho de 2013)

Mas até o prazo acima pode nem chegar a existir, basta o Governo do RN continuar a cometer os erros costumeiros e típicos dessa gestão, que insiste em ignorar certos assuntos. A Administração de Rosalba Ciarlini nunca perdeu nenhum prazo recursal quando se tratava de seus problemas políticos, com várias possíveis cassações, nem de recorrer de decisões judiciais quando os tribunais mandavam contratar policiais, mas errou ao publicar a homologação do concurso que vencerá em 01.04.2014 caso não haja uma publicação retificadora efetivando a validade de 30 de abril de 2014.

Em busca de não perder prazos, a SEJUC iniciou o Curso de Formação que teve início no dia 19 de agosto de 2013 e durou 180 horas/aulas, ou seja, três semanas de aulas teóricas e mais duas de aulas práticas, com os alunos distribuídos em duas turmas.

Aulas 2

O módulo teórico contou com instruções de Direito Constitucional, Lei de Tortura, Abuso de Autoridade, Direitos Humanos, Lei de Execução Penal – LEP e Estrutura do Sistema Prisional. Já no módulo prático as instruções contemplaram táticas operacionais, defesa pessoal, educação física, escolta armada e medidas defensivas, equipamentos de proteção e tiro defensivo e prático, noções de explosivos, além de preparar o futuro agente para diversas situações.

Todo o processo culminou em uma avaliação teórica de alto desempenho de cunho classificatório e eliminatório, foi exigida uma média de 60% de aproveitamento e 90% de presença durante o curso.

Aulas 1

Com a negativa se confirmando, os 87 convocados não passarão de meros atores no teatro gerado à época do curso, para arrefecer os ânimos do CNJ e da população que instava por soluções para o problema. Passado o tempo, o Rio Grande do Norte se encontra em reportagens nacionais pertinentes ao sistema carcerário.

Os alunos e o curso foram certamente usados pela máquina publicitária da Administração Estadual, conforme mostram as fotografias do próprio site do Governo do RN, que podem ser acessadas em http://migre.me/ivU4D e http://migre.me/ivU6x, ou caso o site esteja fora do ar via: https://db.tt/kBczvKSp e https://db.tt/C9esGpVF.

Alunos/candidatos, a população, estão sendo desrespeitados com a mera protelação em convocar, quanto mais com a não convocação, tempo e dinheiro desperdiçados. Prejuízos psicológicos irreparáveis. Frustração e humilhação. Termos que combinados ainda não definem todo o triste quadro de vilipêndio.

Também desrespeitados, os professores do aludido curso de formação da “Escola do Sistema Penitenciário”, que foram Juízes, Promotores e Operadores da Segurança Pública e do próprio Sistema que, gratuitamente, se disponibilizaram a compartilhar seus conhecimentos para a qualificação dos jovens ávidos para contribuírem com o seu Estado, e também na edificação de um mínimo de possibilidades para arrefecer-se o quadro precário do nosso sistema penitenciário estadual.

Considerações

Estamos diante de mais uma possível e iminente grande falha do Governo de Rosalba Ciarlini, que mais uma vez segue silencioso numa política de não divulgar informações, e quando as divulga já não são mais críveis.

Os candidatos que fizeram o concurso se encontram desapontados com essa administração pública, afinal eles se empenharam nesse curso de formação e durante os dois meses em que o período do curso de formação durou, deixaram suas famílias, alguns deixaram o trabalho, outros a faculdade, esgotando a saúde financeira da família. Alguns alunos vieram de outros estados, como Paraíba, Pernambuco e até Rio de Janeiro, gastando aquilo que já não possuíam, pois nem a bolsa de curso o Estado pagou.

E assim prossegue o Rio Grande, cada vez mais de Morte, e menos de sorte, pois não possui rumo nem prumo, nessa corrente de sangue, de impunidade e de morte, onde a mais ténue esperança é desautorizada diariamente.

Urge que o prazo de validade do concurso seja corrigido e que o pouco tempo advindo sirva para as Instituições envolvidas com a Segurança e o Acesso à Justiça parirem uma solução legal e sustentável, pois, no reino da impunidade em que se converteu o RN, qualquer melhoria na área da segurança nos levará a completa insolvência do Sistema Penitenciário.

Como abrir novas vagas num sistema abarrotado sem ter um banco de agentes formados prontos a serem convocados?

Como aduzimos em outras oportunidades, o problema reside na centralização de poder estadual corrente. Centralização para quê e por que, ainda não se sabe. As consequências todos estão a sofrer.

E quase ninguém atentou ainda para a corrosão da saúde mental do povo potiguar, em razão dessa incapacidade de governança em curso em todas as políticas públicas, mas mais perversamente sentidas na segurança e no pouco acesso à justiça.

Mas esse é outro assunto. Por ora, é mister a prorrogação reclamada pelos agentes formados, gestores intermediários e Instituições para que a esperança para a mitigação do nosso quadro grave possa ser abordado de forma responsável e resolutiva por nossas Instituições em tempo hábil.

Ainda é possível. Basta querer economizar. Mas é capaz do governo resolver perder os agentes formados para poder gastar mais num novo concurso.

Foi assim com o Arena das Dunas e quer fazer assim na faraônica obra da Av. Roberto Freire. Stieg Larsson escreveu sobre “a menina que brincava com fogo” nos ares nórdicos, o casal que brincava com fogo é uma tragédia potiguar.

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CITAÇÃO:

LARSSON, Stieg. A Menina que brincava com fogo. Suécia: Companhia das Letras, 2009. 608 p.

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SOBRE OS AUTORES:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Colaborador e Associado Pleno do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.

Marcos Dionísio Medeiros Caldas, advogado e militante dos Direitos Humanos, Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos/RN e Coordenador do Comitê Popular da Copa – Natal 2014, com efetiva participação em uma infinidade de grupos promotores dos direitos fundamentais, além de ser mediador em situações de conflito entre polícia e criminosos e em situações de crise de uma forma geral.

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DIREITOS AUTORAIS E REGRAS PARA REFERÊNCIAS:

É autorizada a reprodução do texto e das informações em todo ou em parte desde que respeitado o devido crédito ao(s) autor(es).

HERMES, Ivenio; CALDAS, Marcos Dionisio Medeiros. Iminente e Possível Triste Final do Curso de Agente Penitenciário. Disponível em: < http://j.mp/1l7tdmu >. Publicado em: 27 mar. 2014.

Ivenio Hermes

Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Integrante do Conselho Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial. Facebook | Twitter | E-mail: falecom@iveniohermes.com | Mais textos deste autor

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