Rio Grande do Norte, sexta-feira, 03 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 8 de fevereiro de 2012

Wando: o homem que amava as mulheres

Wando e a magia de tirar calcinhas sem o, hoje indispensável, auxílio de um carro importado.

postado por Rodrigo Sérvulo

Muitos falam de Chico Buarque e seu poder em compreender o universo feminino, mas ninguém tinha a sensibilidade para tocar esse feminino como Wando. Peculiar em seu trato com as mulheres, ele trazia o espírito de uma época em que os homens (ideais?) tratavam as mulheres não como um objeto de prazer para si, mas como um ser com o qual só podemos alcançar algum tipo de prazer na medida em que damos e cuidamos de uma forma que, sem esse trato, o prazer não seria possível.

Mestre na arte do erotismo, na arte do flerte e na poética de seduzir através de suas palavras e gestos, a linguagem de Wando segue a risca aquilo que o semiólogo francês Roland Barthes fala do poder sedutivo da linguagem: “a linguagem é uma pele: esfrego minha linguagem no outro. É como se eu tivesse palavras ao invés de dedos, ou dedos na ponta das palavras.” As palavras de Wando tinham esse poder de tocar as mulheres de forma mais profunda que se tocar numa pele. 

No meu enterro, ao invés de flores, eu queria calcinhas“, disse Wando antes de sua morte, em tom de bom humor, na minha imaginação. Mas realidade é que as ex-proprietárias das milhares de calcinhas jogadas nos palcos dos shows de Wando estão em luto.

Ele se foi, mas será sempre lembrado como um romântico incurável, não um simples romântico, mas aquele que levou a pieguice até suas últimas consequências, sem torná-la enfadonha e previsível. Assim ele soube elevar um simples artigo de lingerie a um símbolo de adoração ao feminino: ir a um show de Wando e jogar-lhe calcinha tornou-se a celebração de um ritual.

Não importa quais as cores, estilos ou perfumes, todas estão de luto por um dos últimos a adotar um estilo de vida cuja relação com as mulheres não era o da canção “mais raparigueiro do que eu, só papai“, mas da “Eu queria me esconder um dia desses/Num cantinho dos seus olhos só pra ser/Uma lágrima rolando no seu rosto/Pra molhar o seu sorriso ao me ver“.

Obrigado, Wando, por nos ensinar a magia de tirar calcinhas sem o, hoje indispensável, auxílio de um carro importado.

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Rodrigo Sérvulo

Literatura, artes (marciais), humor, sociologia, filosofia e cultura.

3 Responses

  1. Anônimo disse:

    “Cê” é luz….

  2. Thaíssa disse:

    Eu já disse que eu adorava o Wando? Isso sempre foi motivo de riso entre as pessoas que dividem comigo os dias… Talvez justamente por esse meu interesse de investigação do universo feminino, que ele dominava tão bem, não tanto quanto Chico, claro. E como li hoje, de colega psicanalista… “se foi, o homem que alcançava o coração brega das mulheres”

  3. Diego josé disse:

    Ótimo texto!
    Fica aqui a dúvida; por que será que as bandas e cantores atuais, doutores na apelação sexual, não conseguem receber calcinhas de suas fãs, tal qual conseguia o finado Wando?

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