Rio Grande do Norte, quarta-feira, 15 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 4 de abril de 2012

Forrozeiro rebelde e o roqueiro de camisa polo‏

postado por Carta Potiguar

Por Venícius Araújo

A atual “sociedade dos holofotes” anda cada vez mais exposta e menos razoável. Movida à perfis de Facebook e dispositivos capazes de dar a localização exata de sua cama – sem esquecer de expor sua ereção matinal via streaming – os indivíduos estão se tornando cada vez mais previsíveis e identificáveis, parecendo fazer questão de assim parecerem. Vamos usar como exemplo os Oito e os Oitenta.

O Oito é aquele cara que nasceu numa família relativamente conservadora – leia pais católicos que não frequentam a igreja – e sempre fora instigado a estudar como única forma de obter uma carreira bem sucedida financeiramente. Porém, tem no exemplo do pai algo completamente diferente, já que este é um fazendeiro/comerciante/político que ganhou a vida sem o fundamental pra dar embasamento. A mãe, coitada, é geralmente uma dona de casa completamente submissa à vontade do marido e aos mimos dos filhos. Oito teve que ouvir repetidas vezes do pai que “eu lhe dei o que eu nunca tive”. Na verdade, Oito está pouco se lixando pra isso. Passou seus anos no ensino Fundamental e Médio gastando o dinheiro fácil que lhe vinha, caçoando dos menos afortunados e destratando professores. Oito adora forró e camisa polo. Para Oito, beber é um prazer, falar aos quatro cantos que bebeu, é uma necessidade.

Vamos ao outro sujeito: o Oitenta. Esse é bem diferente. Já na juventude passou a questionar as religiões. Fez questão de mentir a si mesmo dizendo que isso era um pensamento próprio e embasado, quando na verdade foi completamente influenciado pelo professor de História do ensino Médio e seus discursos esquerdistas, além de blogs desconhecidos carregados de teorias da conspiração. No colégio, Oitenta andava com seu grupinho geralmente hostilizado por gostar de rock e se vestir de preto. Passou a ter repúdio em ver os familiares sentados à frente da TV aguardando pela novela das oito. – Bando de alienados – pensava ele. Oitenta passa a ser um subversivo de meia tigela, pseudoateu e se rebelando contra tudo o que tem puder, influência ou monopólio. Oitenta não é muito fã de álcool – só tequila ou algum drink completamente americanizado, mesmo odiando os EUA. Oitenta ama a natureza, por isso fuma maconha “natural” carregada de amônia. Compartilha ideais vegetarianos enquanto come o frango frito que a mãe fez e serviu sobre o teclado do computador. Ele ainda não sabe, mas muito em breve irá se tornar um homem de 30 anos, descrente de tudo e trabalhando em algo que odeia. Ah, e iria culpar a Globo por isso. Maldita Globo.

Acho que de  tanto Raul Seixas pedir, o mundo realmente parou. Mas eu continuei. Talvez seja por isso que ontem mesmo eu estava vestindo uma camisa polo e uma calça de “playboy” enquanto ouvia Pantera e AC/DC. Ou, talvez seja por isso que às vezes me pego assistindo Faustão enquanto comento o quão ridícula vêm sendo a postura das entidades religiosas de hoje em dia. Se eu estiver enganado, e o mundo não estiver parado, então, Raul, faço coro a você: parem ele que eu quero descer.

Carta Potiguar

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6 Responses

  1. Francisco Bezerra disse:

    Quem disse “pare o mundo que eu quero descer  foi Silvio Brito” (contestador medíocre, antes de virar carola, fazia dupla com Fabio Junior em um programa musical para adolescentes). O que Raul disse foi “ligo o rádio e ouço um chato, que me grita no ouvido, pare o mundo que eu quero descer”.

  2. Carlos Júnior disse:

    Excelente comparativo. Parabéns!

  3. José Paulo Dantas disse:

    Embora levemente ofendido, confesso que achei merecida a crítica, todo extremismo é burro.

  4. Franklin Nicácio disse:

    Não sei não. Os perfis podem variar. A maioria dos ateus que conheço são do grupo do Oito. Além disso, odeiam qualquer ideia socialista ou mesmo o Estado Social – aquele que tenta corrigir a mão invisível do mercado.

  5. Falecrim54 disse:

    Já ia dizer que “Pare o mundo que eu quero descer” é de Silvio Brito, que aliás era desafeto de Raul Seixas. Mas a critica é real. 

  6. carlos_rc disse:

    Me digam pelo amor de deus como eu saio do convívio dos Oitos? hahah, excelente crítica!!

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