Rio Grande do Norte, terça-feira, 14 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 30 de julho de 2012

A produção cotidiana de sensações e emoções pré-fabricadas

postado por Anderson Soares

Muitas são as constatações psicossociais ao observarmos a relação das emoções com os estímulos externos produzidos pelas poderosas corporações da publicidade, em nome da manutenção dos impérios econômicos; deixando na ordem do dia a instantaneidade, como elemento primordial dos eventos cotidianos.

Num cotidiano de perceptível fluidez, impressiona-nos a intensidade das induções e estímulos (ora explícitos ora subliminares) que nos oferecem a felicidade e sensações de satisfação: “faça”, “seja”, “use” e principalmente, “compre”. Isto nos dá a impressão de que os maquiavélicos homens produtores destes estímulos sabem exatamente dos níveis de vulnerabilidade a que estão expostas as pessoas “comuns”, as que perambulam à procura de sensações que preencham seus vazios existenciais; mesmo que isto resulte em fugacidade e prazeres efêmeros.

Lamentável constatarmos que a manutenção das sociedades modernas e contemporâneas, em sua prática, é baseada no consumismo. O que implica na ausência de produção de indivíduos afetivos e criativos, dos quais tanto necessitamos para a construção de convívio com menos crueldade e apreço pela vida e dignidade humana.

O saudoso geógrafo Milton Santos já havia constatado tetricamente que estas sociedades são incapazes de gerar cidadãos e sim consumidores.
As grandes corporações econômicas celebram os altos níveis de consumo, que muitos confundem com qualidade de vida. As mesmas não estão nem um pouco preocupadas com o adoecimento psíquico de suas cobaias (que podem se resumir, em sua maioria: seres agressivos, narcisistas, depressivos e impotentes afetivos) que reproduzem as próprias mazelas interpessoais que as afligem.

Dentre a produção de seres ávidos por consumir, observamos como conseqüência o esvaziamento das relações humanas, calcado na, cada vez maior, precariedade pessoal e ausência quase que total da espontaneidade dos gestos e ações.
Mais agravante ainda será a construção das percepções (pessoais e coletivas) intoxicadas e doentias dos seres sociais, incapazes de perceber que são os reprodutores e mantenedores de uma gigantesca rede de exploração da miséria humana, devidamente disfarçada e camuflada (quase imperceptível) pelo colorido e “vivacidade” dos ambientes, mensagens e as sedutoras e convidativas imagens de consumo.

A produção da sensação permanente de frustração é um poderoso instrumento de manutenção do consumismo doentio. Sensação esta que pode, inclusive, ser associada a um importante dado: parte grande dos furtos promovidos por jovens (mesmo os de classe média) são motivados pela vontade de obter objetos de consumo glorificados pela publicidade e pela coletividade quase psicopata; ou criação de simulacros de situações de exibicionismo, luxo e poder.

As sensações e emoções fugazes originárias dos estímulos consumistas promovem mais inquietações e infindas frustrações nos indivíduos perambulantes e “invisíveis”. Basta observamos as expressões dos mesmos quando estão nos corredores dos templos e santuários de consumismo (shopping center), a intensidade dos seus olhares “masturbatórios” diante dos objetos desejados para então percebermos e entendermos a eficácia da publicidade maquiavélica diante de seus objetivos.
As grandes corporações econômicas vendem, através de suas ferramentas publicitárias ou de seus templos, sensações “prontas” e pré-fabricadas de prazer e promessa de felicidade; numa realidade em que não serão necessários a espontaneidade, o sentir, interação humana e afeto. Fica-se limitado apenas à condição de consumir e à pouca capacidade de pensar!!!

Para concluir, abordamos esta capacidade de pensar e refletir (o que mais tem sido evitado pelos indivíduos perambulantes). Parece ser muito perigoso e comprometedor, por exemplo, pensar sobre o que diz o filósofo Zigmunt Bauman sobre a contemporaneidade: “O advento da instantaneidade conduz a cultura e as éticas humanas a um território não-mapeado e inexplorado, onde a maioria dos hábitos aprendidos para lidar com os afazeres da vida perdeu sua utilidade e sentido.”

Anderson Soares

Escritor.

2 Responses

  1. Diego disse:

    Nunca vi tanto lugar-comum num texto, visse….

    Só quero fazer minha as palavras de quem fugiu como poucos da superficialidade das análises sobre o consumo: “é sempre bom lembrar que as pessoas não são idiotas” Michel de Certeau, fecha assim a introdução do clássico “a invenção do cotidiano: Artes de fazer”.

    • Andssoares disse:

      Diego,
      Bom citar Certeau e seu clássico, mas a intenção do texto é fazer uma reflexão sobre esta maquinária perversa, comandada por pessoas muito inteligentes que vão  criando estratégias conforme o comportamento doentio de nossa sociedade.
      Pergunto para você: Quem são então estas pessoas (parte significativa da populção) que alimentam de maneira inconsciente esta estrutura que coisifica os seres humanos?
      Ora, neste texto em nenhum momento digo que todos são idiotas, existem aqueles  percebem e a sua maneira começam a resistir e a questionar seu posicionamento em relação aos hábitos. Me refiro explicitamente a uma maioria bovina (que mesmo nesta condição não deve ser subestimada) que parece ser refém, em que muitos num extremo nível de alienação chegam defender e “naturalizar” esta estrutura e os hábitos doentios.

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