Rio Grande do Norte, sábado, 04 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 9 de setembro de 2012

A democracia do sopapo

postado por Gustavo Barbosa

Não se vota em pessoas, mas em projetos políticos, e estes projetos, por sua vez, costumam beber dos mananciais ideológicos adotados pelas agremiações que os encampam como modo de gerir. Rosalba Ciarlini, alçada como prefeita exemplar de Mossoró por badaladas peças publicitárias e por meios de comunicação que prestam uma comovente vassalagem a um certo coronel-concessionário – aquele mesmo, de fronte aloirada e linguajar pavoneado que, através de um discurso mais frágil que um pinto reumático, costuma se entronar como impávido baluarte da ética e dos bons costumes – cabeça do seu grupo político, vem mostrando de fato a que veio: diminuir o Estado de forma estrutural, cortando investimentos em áreas essenciais de modo a fundamentar futuras e atuais iniciativas que envolvam privatizações/terceirizações de serviços públicos, colocando atividades-fim sob o controle único da iniciativa privada e do mercado.

Não bastaram a edição do decreto que impedia a realização de protestos e manifestações na governadoria (aquele que a governadora assumidamente assinou sem ler) e a completa falta de diálogo com as inúmeras categorias em greve este ano, Rosalba vem adotando recentemente uma nova tática para ofuscar sua inépcia administrativa através de outra iniciativa não tão condenável, é verdade, quanto o fato de deixar que pacientes padeçam à míngua nos deploráveis corredores do Walfredo:

reprimir com extrema truculência os insolentes que, atrevidos, resolvem pacificamente se insurgir contra o caos administrativo que se instaurou na cidade bem como contra sua revolucionária maneira de administrar, internacionalmente reconhecida em virtude da experiência mossoroense.

Foi assim com os recentes protestos contra o arbitrário aumento das passagens de ônibus em Natal e com as manifestações ocorridas no sete de setembro em favor de um serviço de saúde digno que, apesar do estado de calamidade decretado pela própria governadora há dois meses, recebeu apenas 2,28% das verbas previstas para cessar esse quadro. A tais desocupados, apenas a borracha dos projéteis e cassetetes das tropas militares, munidas de uma carga ideológica que explicita ainda mais o imoral e anti-democrático DNA de quem em um passado não tão distante foi UDN, ARENA, PDS e PFL.

Pavor à democracia

Surpresa? Óbvio que não. As origens históricas e as diretrizes programáticas do pefelê são gritantes no que diz respeito ao seu modo de governar e de lidar com os ônus inerentes a qualquer regime democrático, mas o marketing político, que embala candidatos como mercadorias e trata o eleitor como um consumidor palermóide, despolitiza ao forçar a exclusão do debate de informações que tratem especificamente da forma de administrar de determinados candidatos. No lugar de uma discussão estrutural e menos superficial, é adotado o vazio e genérico discurso do “melhorismo” (geralmente acompanhado de um moralismo que beira à patetice e que igualmente não quer dizer nada com nada), abordando apenas as universais finalidades consensuais-padrão de “aprimorar”, “melhorar”, “dinamizar” e “ampliar” os serviços públicos essenciais; as condições, as formas e os meios para isso, estes sim, que passam necessariamente por um imprescindível debate político-programático e ideológico, são quase sempre esquecidos, principalmente no que tange a candidatos de viés conservador. Uma omissão que custa caro e acaba por não melhorar nada e muito menos moralizar coisa nenhuma.

Junte-se isso à devastadora compra de votos, à histórica precariedade do sistema educacional, à miséria cultural e financeira que fragiliza e expõe a população hipossuficiente aos arroubos do – ainda vivo, forte e mais atuante do que nunca – voto de cabresto, ao abuso de poder econômico e à promiscuidade do público com o privado e eis o que fatal e historicamente costuma acontecer: a vitória eleitoral de aberrações oligárquicas como Rosalba e tantos outros governadores que o Rio Grande do Norte teve em sua história e que tem como característica comum, dentre outras coisas, o fato de nutrirem um verdadeiro e único horror à democracia.

Isonomia

Como, com sua peculiar sagacidade, bem observou Daniel Menezes sobre os protestos da última sexta, “se a Polícia Militar agride uma procuradora da fazenda nacional, Elke Cunha, na frente da governadora, em plena luz do dia, no 07 de setembro, caro leitor, imagine como deve ser o “baculejo”, a noite, na periferia de Natal.” Pelo que se vê, democracia para o governo do estado existe somente na hora da PM distribuir indiscriminados sopapos nos que resolvem fazer, vejam vocês, o disparate de exercer pacificamente o direito constitucional de reunião e de liberdade de expressão. Na hora de sentar os cassetetes nos manifestantes, aí sim, a o governo, por meio da PM, refuta todas as acusações sobre o seu caráter arbitrário e mostra que de fato trata todos de forma igual, deixando claro aos indolentes inconformados com a gestão da Rosa que esta preza sim pela democracia e pelo igual tratamento a todos os seus administrados. Falta apenas usar isso como publicidade eleitoral em 2014.

Gustavo Barbosa

Advogado.

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