Rio Grande do Norte, quarta-feira, 01 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 12 de maio de 2013

Em defesa da descriminalização das drogas no Brasil

postado por Daniel Dantas

Publicado originalmente no No Minuto

Mal informada pela mídia, pela polícia e pelos governos, a opinião pública, principalmente no Brasil, olha para o lado na questão das drogas. Ainda mais agora que uma força conservadora, quase incontrolável, varre o debate público.

A opinião pública olha para os consumidores de crack nas craquolândias Brasil afora. Olha também para o pequeno traficante, muitas vezes funcionário subalterno da indústria das drogas. Aliás, não raro, celebra a morte desses bandidos.

Por que eu digo que olha errado?

O tráfico de drogas é o negócio mais rentável do mundo contemporâneo. Movimenta, segundo a ONU, a bagatela de US$ 400 bilhões ao ano. Somente esse dado vale a pergunta que eu ouvi, a primeira vez, ser feita pelo advogado Marcos Dionísio Medeiros Caldas: Com um negócio tão lucrativo, quem é capaz de acreditar que o dono do tráfico continue morando nas favelas? Em outras palavras: numa indústria de cifras tão bilionárias é ingenuidade acreditar que gente como Fernandinho Beira-Mar, por exemplo, ocupe posição de relevo na organização.

Os donos do tráfico moram nos endereços chiques de nossas cidades. E posam de homens de bem – possivelmente daqueles que defende a pena de morte para o pequeno criminoso que cometeu um crime contra a vida ou contra o patrimônio privado.

Inúmeros bancos sobreviveram à bancarrota da crise mundial porque são usados no maquinário de lavagem de dinheiro do crime organizado global, mostra o jornalista italiano Roberto Saviano na edição de Carta Capital desta semana.

A matéria de capa dessa edição de Carta Capital, em um texto muito bom, aborda – e defende – a descriminalização das drogas. Comprova, com muitos exemplos, que a descriminalização das drogas sufocaria, inevitavelmente, a participação do crime organizado internacional no negócio – com evidente diminuição da violência. Os números internacionais mostram, inclusive, que ao contrário do que afirma o discurso conservador, as experiências de controle e liberação de comércio e consumo de drogas leves diminuem a incidência de drogas pesadas entre os usuários. Além de reduzir os números de doenças como AIDS e, é claro, o número de presidiários.

Além disso, mostra como é muito mais eficiente, no enfrentamento da questão, as políticas de redução de danos que as posturas repressivas. Aliás, lembra bem a matéria de Willian Vieira, o tratamento do usuário deveria ser questão de saúde, não de polícia.

O governo federal lançou, ano passado, o programa “Crack, É possível vencer”. Prevê o gasto de R$ 4 bilhões – inclusive adquirindo armas de choque e treinando policiais para o seu uso.

Olhamos para o lado errado. Por isso, nos submetemos a transferir recursos para “comunidades terapêuticas” tratarem dependentes, ao invés de investirmos na capacitação e melhoria da rede de saúde, como os CAPS AD, para um tratamento adequado à questão.

Esta semana surgiu em minha timeline do twitter um apelo para que a sociedade faça algo urgente sobre o crack. Se depender de como vem sendo informada nossa opinião pública, não há futuro: qual sociedade vai se preocupar com um enfrentamento adequado da dependência química se é essa sociedade que aplaude o extermínio de usuários ou sua internação compulsória?

Não, não queremos lidar com a questão do crack ou de qualquer droga. Queremos excluir de nosso campo de visão os usuários e os problemas que causam.

P.S.: Em Goiânia, um grupo de extermínio tem executado moradores de rua. A polícia não investiga adequadamente porque já encontrou a razão das mortes: consumo de drogas e dívidas com traficantes. A polícia potiguar se comporta de igual modo: qualquer morte com sinais de execução se transforma em acerto de contas com tráfico. Desse modo, a sociedade se dá por satisfeita (afinal, em sua visão, consumidor morto é menos crime na cidade), a imprensa esquece o caso e a polícia se furta a investigar, de verdade, as mortes.

Isso prova que não estamos preocupados com o impacto negativo das drogas: queremos limpar nosso campo de visão dos usuários. Bom que estes sejam mortos ou internados compulsoriamente.

3 Responses

  1. A questão é bem simples…morre mais gente no combate ao tráfico do que no consumo de drogas…resta dúvida?

  2. Lucas disse:

    Se com argumentos serios ja esta dificil conseguir que a sociedade aceite a descriminalização, imagina com subjetividades. Dizer que os verdadeiros chefes do trafico sao pessoas influentes da sociedade sem provas, sem fatos, apenas com achismos é facil, e mentiroso, pois vejamos, dizer que beira mar não esta no topo e que existe alguem acima dele, cabe a pergunta, porque entao a PF não descobriu? incompetencia duvido, proteção porque é alguem influente, bem pra ser tão influente assim no minimo deve ser algum chefão do pt, será?

    Outra coisa, tentam comparar as mortes das drogas com as mortes do alcool. Esse é mais um indicio de que não deve legalizar, alcool mata tanto justamente porque é legal, se fosse ilegal mataria bem menos, e é por isso que tantas leis estão aparecendo pra endurecer o uso do alcool, ai vem voces quererem legalizar mais drogas ainda? e dizer que isso vai ajudar, não vejo como. Isso sem contar que, legalizada, essas drogas vao criar um lobby tão forte no congresso, que daqui a 10, 20 anos quando a sociedade perceber o erro que foi legalizar, nunca mais vai conseguir voltar atras na decisão.

    Outro argumento é que vai diminuir a criminalidade e reduzir o numero de presos, bem pensando que basta uma canetada pra diminuir a criminalidade, talvez possamos aproveitar e tambem descriminalizar o roubo de caixas eletronicos que tal, isso com certeza vai diminuir a criminalidade, ou talvez legaliar o assassinato, que ai sim vai diminuir consideravelmente o numero de pessoas nas cadeias, dessa forma agente ja pode ate pensar em acabar com a policia por falta de crimes a serem cometidos, pelo amor de deus que argumento é esse.

    Mais um fator, querer comparar sociedades bem mais organizadas com o brasil é ate piada, se na holanda tem problemas com o trafico de drogas, mesmo elas sendo legalizadas, imagina no brasil. É falacia dizer que a descriminalização vai acabar com o trafico, e para tanto é so verificar todos os problemas e corrupção causados pelo trafico de cigarro e de bebidas que acontece no brasil, achar que nao sera da mesma forma com outras drogas é ingenuidade.

    A descriminalização é defendida pela parcela que esta louca pra manter seu vicio vagabundo sem se misturar, sem ter que sair de candelaria, ponta negra, e ir ate Felipe Camarão, ou Mãe Luiza pra comprar sua droga e ter que se misturar com gente de favela, que adora ir pra BCZM buscar em livros argumentos inuteis como desse texto, mas que nunca mexeu a bunda da cadeira pra conversar com a familia de um viciado e saber da dor que é droga nessa familia, que gosta de falar em paz mas sustenta o crime, que ja sabe que num eventual plebiscito perderia e ainda assim não aceitaria o resultado, pois democracia é uma palavra bonita, mas que so vale se o resultado for favoravel senao vem com essa de que a sociedade é hipocrita e atrasada. Como dizia a propaganda, “droga se fosse bom não teria esse nome”.

    • Daniel Dantas disse:

      Lucas,
      Eu escrevi uma reflexão sobre uma matéria que está repleta de seus dados. Exemplo: o rendimento do tráfico de drogas é de US$ 400 bilhões por ano para o Crime Organizado internacional – que lava esse dinheiro na rede bancária oficial. Vc acha que o dono desse negócio mora em Mãe Luíza?
      Em Natal, muitos anos atrás, um importante empresário foi preso por tráfico. Em dois dias, a notícia sumiu dos jornais, no meio do governo Garibaldi. E o tal empresário continua um homem de bem e de bens na sociedade potiguar.
      Concordo plenamente que um caso como esse não pode ser debatido na forma de achismo.
      Mas também não podemos utilizar argumentos toscos. Uma coisa é criminalizar o usuário de drogas. Na nossa Constituição, não existe a figura jurídica de criminalizar alguém que só faça mal a si próprio. Por isso, consumir drogas é diferente de roubar caixas eletrônicos.
      Nesse caso, a experiência em pelo menos 20 países em que as drogas foram descriminalizadas e o Estado passou a regular seu consumo e distribuição apresenta resultados positivos, seja no que se refere à diminuição da criminalidade, do consumo de drogas pesadas ou de doenças infecciosas relacionadas ao consumo de drogas.
      Esses, meu caro, são dados.
      E é tão absurdo querer comparar a descriminalização das drogas a homicídios ou roubos de caixas eletrônicos que nem merece resposta. Mas essas espécie de crime mostram que o fim do tráfico não acabaria com o crime organizado, como eu disse, mas sufocaria um de seus braços financeiros.
      Sobre o convívio com dependentes químicos, você não me conhece.
      Por isso mesmo, rejeito seu direito de afirmar que eu nunca mexi “a bunda da cadeira”…
      Pessoalmente, como evangélico que sou, sou contra o consumo de drogas. Mas isso não me permite achar que todos devem pensar como eu. Cada um precisa ser livre para tomar suas próprias decisões.
      Ainda assim, como evangélico que sou, considero a postura mais cristã a política de redução de danos, associada à descriminalização do consumo com controle do estado. Drogas não devem ser tratadas como questão de polícia, mas sim de saúde pública.
      Ainda sobre o tema, a matéria da Carta fala que em impostos os EUA poderiam arrecadar US$ 46 bilhões por ano com a descriminalização. Dinheiro que, por exemplo, poderia ser investido nas políticas públicas de saúde relacionadas ao tema. No Brasil, o cenário é semelhante.

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