O vídeo em que um rapaz aparece, num show de forró, rasgando uma nota de cem reais e chamando todo mundo de “liso” ganhou as redes sociais. Com inúmeras manifestações de indignação, o jovem está sendo alvejado, fortemente criticado pelos internautas – “futil” e “babaca” foram os qualificadores mínimos utilizados por quem repercutiu o fato. Mas a perplexidade esconde outras nuances (link para o vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=pGWXy5y02nw).
Sem dúvida que a ostentação causa certa ojeriza, uma antipatia. Pois, na verdade, a demonstração de uma superioridade boçal atenta contra a formação de interações entre os sujeitos, digamos, menos heterônomas. Agora, ela não é tão exótica assim como aparentemente se imagina. A chamada – um pouco na forma de bobo alegre – “nação forrozeira” vive, se retroalimenta de músicas, práticas e expressões que têm no esbanjamento de dinheiro e no pouco cuidado com o outro algumas de suas marcas significativas: caminhonetes importadas, bebidas caras (uísque com red bull), equipamentos com seus sons impositivos e afirmações depreciativas com relação às mulheres “dão a linha”, como falam os meus amigos da política, do discurso compartilhado.
Na ambiência das festas de forró mostrar que “dinheiro não é problema, é solução (mas para o que?)” representa um passaporte para a condição de supercidadania, credencia para o status de “chefe”. Um respeito, seguindo a linha da hierarquia preconceituosa, “diferenciado”, de acordo com a música de Forró citada abaixo.
É O CHEFE
Patrocina ousadia, e as novinhas se derretem
É o chefe, é o chefe
Considerado, respeitado, e com ele ninguém se mete
É o chefe, é o chefe
Quando chega na balada, sempre chama atenção
Pelas roupas que ele usa, e a grossura do cordão
Deixa os playboys rasgar, sempre com muita fartura
Whisky com Redbull, a mais perfeita mistura
Trata todos com respeito, isso é já de costume
As novinhas ficam loucas com o cheiro do perfume
Gosta de ostentação e não tem problema algum
As novinhas ficam doidas pra andar de R1
Ser “liso” segue o caminho inverso. Se preocupar com os custos da consumação num bar, ficar aperriado com os gastos em uma festa são sinônimos de inferioridade moral, de subcidadania. O não abastado é enquadrado como desprezível. Ele pode ser tudo: “feio”, mas, jamais, “Liso, liso, sai daqui seu liso!”.
É MELHOR SER FEIO
É melhor ser feio, mas ser endinheirado
Do que ser bonito, sem nenhum centavo (4X)
Eu posso até não parecer o Brad Pitt
Mas eu não posso reclamar, mulher pra mim não falta
Aonde eu chego, eu só fico com elite
Garotas que você nunca vai sonhar pegar
E você aí, sem nenhum real, se achando o tal
Pensa que a mulherada vai ficar na tua
Chega na balada, se achando o cara e não pega nada
Pode ir tirando o seu cavalinho da chuva
Liso, liso, sai daqui seu liso!
Liso, liso, sai daqui seu liso!
O dinheiro rasgado, no final das contas, é a ponta do iceberg de um grande universo que torna regra uma cultura hedonista, machista e pouco afeita aos laços constitutivos de cidadania. Ao invés de repulsa, deveria gerar reflexão.
Antes de comentar o que o texto me provocou, gostaria de pontuar algumas questões:
Eu não sou sociólogo e este não é nem um tratado nem um ensaio sobre o comportamento humano. Além disto, esta não é uma defesa do sujeito, nem da nação forrozeira.
Dito isto…
Quanto anacronismo, preconceito e soberba intelectual! Acho que o texto suscita timidamente temáticas importantes como a questão do “fracasso da cidadania” e a questão da ostentação e dessa cultura “beijinho no ombro” – antes que me condenem, gosto da Valesca e a percebo enquanto um ícone, sim; mas tudo contra essa cultura individualista do “beijo pro recalque ‘dazinimiga'”. Contudo, que infelicidade a construção deste esteriótipo da nação forrozeira enquanto o grupo representante da “rasgação de dinheiro” e do desrespeito.
Ora, qual grupo/”tribo” não tem símbolos materiais de sucesso? Qual grupo/”tribo” não tem comportamentos padronizados e legitimados? Qual grupo/”tribo” não comete excessos? Qual grupo/”tribo” não desrespeita a vida em comunidade ou questões de cidadania? Qual grupo/”tribo” está livre do consumismo? A cultura hedonista, machista só está presente na nação forrozeira? A nação forrozeira é só isso aí?
Não acredito na neutralidade ao defendermos ideias e ideais. Mas, ora, nosso preconceito ou opiniões tão rasas não deveriam virar proposições generalistas.
Acho um texto muito astuto e alheio de crítica (a tal alternativa) a si mesmo. Cadê o editor da revista?
Esse gordinho representa muito bem o momento infeliz do brasileiro. Tantos problemas sociais e prioridades para uma vida digna e nos deparamos com um “inergumeno” desses que pensa ser bem sucedido em rasgar notas de dinheiro, estamos nos deparando com as construções bilionárias para receber a COPA da Fifa enquando estamos sem materiais básicos num atendimento do sistema de saúde, sem citar o de educação. De quem é a responsabilidade?? É nossa. E enquanto nós não assumir essa culpa e responsabilidade iremos ver mais “gordinhos inergumenos” desses dançando com o dinheiro do papai e da mamãe que são políticos de prefeituras do estado do RN. O gordinho rasgador de dinheiro exprime sua maior realidade que é a falta de respeito próprio, imagine com os outros.