Do blog “Cinema Secreto: Cinegnose” – O trágico mergulho fatal do Cessna Citation em Santos não só mudou o cenário eleitoral como modernizou o arsenal de bombas semióticas midiáticas. No momento em que a grande mídia esgotava sua estratégia semiótica ainda condicionada pela Guerra Fria (criar a percepção de caos e pré-insurreição ao anabolizar as manifestações de rua), eis que surge Marina Silva com o mix de ambientalismo, fundamentalismo religioso e neoliberalismo potencializado por duas poderosas bombas semióticas saídas diretamente do atual kit linguístico de manipulação do mundo corporativo globalizado: a bomba do “Sim!” e a bomba neuromarketing do “Storytelling”. O problema para os marqueteiros é que Marina Silva não é um candidato à venda, mas uma narrativa sincromística oferecida para pessoas sedentas por histórias que seduzem mais do que os dados frios e duros da realidade.
Quem não se lembra do personagem Church Lady feito pelo comediante Dana Carvey no quadro chamado Church Chat no programa Saturday Night Live de 1986-1990? Sempre preocupada com as conspirações de Satã nesse mundo, Church Lady sempre soltava um bordão irônico ao perceber satânicas coincidências: “How con-VEEN-ient!” (“Tão conveniente!”).
É difícil não perceber a extrema feliz coincidência e conveniência no trágico acidente aéreo de Santos que vitimou o candidato à presidência Eduardo Campos: foi um divisor de águas no cenário eleitoral, substitui um combalido Aécio Neves pelo fator novidade de Marina Silva e, principalmente, renovou de uma hora para outra o arsenal de bombas semióticas justamente a poucos meses das eleições. Exatamente num momento em que se iniciava a propaganda eleitoral na TV com a candidata à reeleição ocupando a maior fatia de tempo para mostrar suas realizações.
Como vimos em uma série de postagens, desde as grandes manifestações de rua de junho do ano passado a grande mídia apostou em um tipo de bomba semiótica que criasse no contínuo midiático uma percepção de caos, desordem e de um país em um estado pré-insurrecional: fusca incendiando com família inteira dentro, índios invadindo Brasília, sinistros black blocs. Tudo acompanhando pelo suposto crescimento endêmico da inadimplência e da disparada do preço do tomate.
O inesperado (para a grande mídia) sucesso da Copa no Brasil, tornou extemporânea uma pretensa escalada de manifestações nas ruas que incendiaria o cenário eleitoral.
Mas o mergulho fatal do jato Cessna Citation em Santos mudou de um só golpe uma eleição que caminhava para uma decisão ainda no primeiro turno. De certa forma, foi a bala de prata que tanto a grande mídia esperava na Copa do Mundo e que saíra pela culatra.
A modernização do arsenal semiótico
Talvez ainda condicionada pelo modus operandi midiático desde os tempos de IPES-IBAD de 1962-64 e de toda estratégia de desestabilização política que resultou na queda de João Goulart e o golpe militar, a grande mídia tentava atualizar as velhas bombas semióticas paranoicas com sabor de Guerra Fria. Era necessária uma modernização radical, que somente poderia vir do arsenal semiótico globalizado e corporativo do pragmático mundo do capital financeiro por trás da candidata Marina Silva.
O mix de ambientalismo, fundamentalismo religioso e neoliberalismo no programa da candidata do PSB vem potencializado por duas poderosas bombas semióticas saídas diretamente do atual kit linguístico de manipulação de multidões: a bomba do “Sim!” e a bomba neuromarketing do “Storytelling” – sobre o conceito de “Kit linguístico de manipulação” clique aqui.
A bomba do “Sim!”
Quem se aproximou mais dessa constatação foi Ciro Gomes em uma entrevista ao jornalista Kennedy Alencar: “O discurso de Marina é uma tragédia porque é fragmentado, porque ela fala de valores muito caros e com muita decência e honestidade. Por isso é uma tragédia. Ela tem valores corretos: está preocupada com os índios, com os passarinhos, calangos, bagres… mas é um valor fragmentário. Como estadista deveria encontrar um equilíbrio entre meio ambiente e geração de energia. Mas ela é contra tudo”.
Ciro Gomes conseguiu levantar uma das chaves semióticas do discurso de Marina Silva: a bomba do “Sim!”. Essa estratégia linguística surge da tática corporativa da busca dos “temas globais de consenso”: temas de fácil adesão, porque ninguém pode dizer “não!”. Porém, são temas colocados de forma fragmentada, descontextualizada e, principalmente, despolitizada.
A publicidade e o marketing globais se tornaram autoconscientes. Já absorveram a principal crítica que é feita ao mundo das imagens publicitárias: a alienação e a inexistência de consciência social. Críticas como as feitas pelo fotógrafo das campanhas da Benetton Oliviero Toscani, principalmente em seu livro A publicidade é um cadáver que nos sorri, onde acusa o mundo publicitário de alienante e distante dos problemas sociais, são levadas em consideração no cálculo dos choques culturais que determinadas campanhas possam ter no mercado mundial.
Por isso o marketing global incorpora temas como AIDS, pobreza, violência, consciência ecológica, trabalho infantil e associa os mais diversos produtos a estas causas para criar uma imagem de engajamento e preocupação política e social. Como as campanhas globalizadas podem adotar temas tão polêmicos que, potencialmente, podem prejudicar os negócios ao criar críticas e oposições ideológicas? Simples: despolitizam-se estes temas ao serem tratados de forma genérica ou abstrata, produzindo imediata adesão e simpatia nos consumidores de todo o planeta. Ninguém pode ser a favor da destruição da camada de ozônio, da pobreza no terceiro mundo ou do trabalho infantil. São temas que criam consenso instantaneamente.
“Yes, We Can”: o grau zero do signo
Por exemplo, o que dizer de eventos como o Rock in Rio promovido pela América on Line em 2001 cujo slogan era “Por um Mundo Melhor”? O slogan era de fácil adesão: quem pode ser contra esta ideia? Contudo, para a audiência “Um Mundo Melhor” foi apenas mais um outro slogan, engolido pelo mar de logotipos de 15 patrocinadores espalhados por todo o local. COMO fazer um mundo melhor? Isso jamais foi discutido entre um show e outro.
A bandas de rock U2 em 2004 fez uma série de shows em prol do perdão da dívida do Terceiro Mundo como a única forma de acabar com a fome e a pobreza. Mas, em coletivas com a imprensa, o líder da banda Bono Vox nunca propunha COMO poderia ser operacionalizado este perdão das dívidas externas. Tudo permaneceu no plano dos slogans, evitando politizar a questão porque, afinal, a banda U2 tem fãs de diferentes matizes ideológicas. Propostas concretas poderiam gerar polêmicas prejudiciais às metas mercadológicas globais da banda e da gravadora.
Quando Obama na sua campanha presidencial em 2008 bradou o slogan “Yes, We Can!” colocava em prática essa poderosa bomba semiótica: genérica, afirmativa, de fácil adesão porque fragmentada. Tão genérica que nenhuma crítica ideológica consegue confrontá-la. O grau zero do signo. Semioticamente perfeita!
“Storytelling” e Neuromarketing
Vários estudos ao longos dos anos, e confirmado por pesquisa da Nielsen em uma série de Workshops em 2004, demonstraram que os consumidores querem uma conexão mais “pessoal” com as informações – os nossos cérebros se envolvem muito mais facilmente com narrativas do que com fatos ou números duros e frios – leia “Using Storytelling to Identify Requeriments”.