Rio Grande do Norte, sexta-feira, 26 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 29 de março de 2016

Eu não te odeio, Bolsonaro.

postado por Alice Carvalho

Caro Jairzinho,

Venho por meio de mais uma dentre as minhas tantas cartas abertas que publico aqui na Carta, afirmar em alto e bom capslock que NÃO TE ODEIO. É isso mesmo que você leu: a artista-esquerdista-abortista-maconhista-feminista-gayzista aqui, NÃO TE ODEIA. Sim, você pode fazer sim um screenshot e compartilhar essa confissão com seus amigos pró-milicos, pró-bancada e pró-tudo-que-for-contra-tudo-que-de-fato-é-em-prol. Não, essa não é mais uma ironia incauta de uma pirralha metida a entendida, deixa eu te explicar melhor.

Não tive ainda o prazer de lhe conhecer pessoalmente, querido Bolsô, mas é provável que seu ego auto-stalkeativo lhe traga como um GPS até esse link, então aproveito o espaço para afirmar minha complacência com a sua falta total de generosidade.

Eu sou artivista (um hibrido de artista com ativista, mas você também pode me chamar de “pentelha”). Sempre fui aficionada por estudar a estória desse país e a verdadeira história também, aquela politicamente incorreta, a que clareia nossos pensamentos para a verdadeira face dos omens sem o H, os que brotaram nas terras Tupiniquins com um discurso cordial. Esses rapazes, por incrível que pareça, deram origem a outros rapazes. Esses outros rapazes deram origem a outros, e outros, e outros, num ciclo reprodutivo desse pensamento patriarcal – e o mais doido é que nem precisa de coito para a reprodução, surgiram assim como Gremlins diabólicos, bastava um ter voz ativa que o outro se contaminava.

Onde eu quero chegar com essa conversa é exatamente aonde você está, ‘Sonarinho: você é um deles. É justamente por isso que eu não te odeio. Nem a você, nem aos seus filhos igualmente pobres de espírito. Não odeio também o Feliciano e nem o fofo do Malafaia. Falo “porco imundo” com muito respeito ao animal, inclusive. Não há espaço em mim para odiar alguém que é um serviço de alto-falante humano, uma pessoa que desgosta sem conhecer e oprime sem enxergar, alguém que sofreu lavagem cerebral desde cedo. Você é resultado de um processo de crueldade de machões, que perdura na sociedade até hoje mas que – graças a graciosidade de muita gente do bem – está caindo por terra aos poucos.

Não tem cabimento no caráter que me cabe, agredir alguém que é – de fato – doente. O ódio que eu não tenho em nenhuma partícula do meu corpo é o que alimenta senhores como você a, sem nem saber o porquê, transpirar de nervoso com o que é diferente do padrão. O ódio que você grudou na própria pele tem a força extrema e oposta ao amor que me faz querer que você também se ame mais, que evolua, que despenda menos tempo de vida propagando palavras ruins a esmo.

Nesse mês que passou, por exemplo, perdi o laço com dois primos próximos, bem novos inclusive, que se deixaram levar pelo seu discurso barato de moral e bons costumes – aquele que exalta a diversidade e o respeito a ela como um crime, ao invés de trazer argumentos que nos elevem enquanto seres humanos – e nesse quesito, mesmo não lhe odiando, Jair, não posso acatar suas palavras calada. Quando se tem amor pelas pessoas a gente tenta fazer com que elas só propaguem amor também. Talvez você já tenha se sentido assim em algum momento da sua vida e seja exatamente isso o que procura equivocadamente agora.

Não lhe julgo, você é só um Ctrl C + Ctrl V ambulante das suas próprias opressões. Você vaga por aí gritando sem dizer nada, Senhor. Seus olhos insones estão rodeados de uma olheira que não é falta de dormida, é falta de descanso. Seu travesseiro pesa quantas toneladas?

Não lhe odeio sob nenhuma circunstância, porque eu sei que esses absurdos que você diz fazem parte dessa mente infantil que não quer nunca dar o braço a torcer, apenas tiranizar.

Se você quiser tomar um café qualquer dia desses eu topo. Topo também levar você pra dar um passeio, comer um churros e lhe dar a atenção que você tanto necessita para parar de dizer o que diz contra mulheres, negros, gays e todas as coisas que você maldiz só pelo poder de maldizer pra ocupar a cabeça vazia – e gente vazia pode ser mesmo muito perigosa. 

Você não é vilão, você é um bobo, um moço ignorante, um pobre coitado, um ser que só vai evoluir quando for amado. Tadinho.

Ah, só tenha muito cuidado: esse seu excesso de ausência de si, um dia pode te matar.

 

Atenciosamente,

Alguém que se compadece da sua enfermidade.

 

 

 

 

Alice Carvalho

Atriz, comediante stand-up e escritora, Alice escreve às terças (e também em terceira pessoa).

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