Rio Grande do Norte, terça-feira, 30 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 12 de junho de 2012

Namorados virtuais

postado por Arthur Dutra

É dia dos namorados e aquele casal sai para comemorar a data em um belo restaurante de cidade. Ele toma banho, escova os dentes, veste uma roupa limpa e engomada; ela compra roupa nova, faz escova no cabelo, se maqueia com esmero, usa aquela lingerie sexy, faz as unhas e passa o perfume que ele mais gosta.

Ao buscá-la em casa, ele a surpreende com um buquê de flores, um embrulho contendo um presente e um cartão. Ela recebe, chora e o abraça com paixão. Em retribuição, lhe dá um presente e um cartão enfeitado de corações e beijinhos, tudo dentro de uma caixa enorme, embrulhada com muito capricho por ela própria. Ele não chora, mas acha massa a camisa nova do seu time que acabou de ganhar. Trocados os presentes, vão para o jantar romântico.

A fila enorme não desanima os amantes, sequiosos por uma refeição comemorativa – assim como os outros casais enfileirados. Depois de uma hora de espera conseguem uma mesa próxima à porta de saída, local de passagem tanto de quem entra como de quem sai. Não importa. Nada pode estragar aquele dia dos casais enamorados. Sentam-se e solicitam o cardápio ao aturdido garçom. Um frenesi de vozes domina o ambiente, num turbilhão inaudível de pedidos de vinhos, risotos e declarações de amor.

Trocam olhares apaixonados e um aperto de mãos até que são importunados pelo garçom com a entrada e uma garrafa de vinho. Petiscam aquela iguaria entre um gole e outro, e continuam a esperar o tempo passar.

Enquanto isso, cada um saca o seu BlackBerry e começa a explorar suas infinitas possibilidades virtuais: Twitter, Facebook, BBM, WhatsApp etc., obtendo em tempo real a situação de outros restaurantes da cidade.

– Olha, amor, no restaurante tal a fila de espera está…

Sem levantar o olhar do visor do aparelho ele responde:

– Já vi a foto no Twitter.

Sem qualquer surpresa com a resposta, ela volta a teclar no seu aparelhinho mágico.

Passam minutos valiosos conectados com o mundo – desconectados um do outro – aguardando a chegada do prato principal. Ele já está arrependido do seu pedido, pois um amigo que está do outro lado do restaurante o informa pelo WhatsApp que o spaghetti que está degustando é uma maravilha.

– Porra, eu pedi outra coisa – fala primeiro para o amigo, e depois para a namorada, responsável pela sugestão.

Ela desanima e fala para a melhor amiga pelo BBM:

– Ah, amiga, pedi um prato mas acho que ele não vai gostar.

Sem problemas. Mesmo assim eles comem, silenciosos, aquele indesejado prato, molhando a garganta com um bom vinho, e depois vão embora.

Quando pensa que a noite romântica foi um fracasso, já no carro ela dá uma última checada no celular e vê uma mensagem dele no BBM:

– Te amo!

Seus olhos se encheram de lágrimas e eles se embalaram num caloroso abraço, que terminou na quilométrica fila no motel mais próximo.

Arthur Dutra

Advogado. Editor, proprietário, patrocinador e único escritor do blog "Escritos Improvisados" (http://escritosimprovisados.blogspot.com). Twitter: @ArthurDutra_

5 Responses

  1. Diego José Fernandes Freire disse:

    É o amor na sociedade virtualizada!

  2. ADRIANA BEZERRA disse:

    Fui ficando triste ao ver que estavam com tremores na noite do amor, mais voces como sempre finalizam do jeitinho que queríamos… Ficaram na fila do motel, mas certeza que ao entrarem esquecerão de tudo.. Excelente texto Arthur Dutra como todos que você escreve PARABENS sou sua fã !!!

  3. Virgem disse:

    Quer dizer que a chave é mandar a mensagem “Te amo” pelo BBM. Agora vai…

  4. Carlinhos DutraCaedual disse:

    Arthur, hoje em dia até o amor está dependendo da tecnologia. É uma pena! Um abraço. Carlinhos Dutra.

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