Rio Grande do Norte, terça-feira, 14 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 21 de outubro de 2012

Em defesa dos partidos políticos

postado por Carta Potiguar

Alan Daniel Freire de Lacerda

Professor do Departamento de Políticas Públicas (UFRN) e doutor em Ciência Política (IUPERJ)

 

Um espectro assombra diversas discussões públicas em Natal – o espectro do “apartidarismo”. Em diversas circunstâncias, os partidos políticos e seus militantes têm sido vistos negativamente, ou até mesmo sido hostilizados, por cidadãos, muitos deles jovens, envolvidos em distintas mobilizações. Emissões de opinião neste sentido ocorreram no movimento Fora Micarla em 2011 e, mais recentemente, na chamada Revolta do Busão, contrária ao aumento do valor das passagens de ônibus.

No movimento estudantil (ME) da UFRN, é comum se ouvir a crítica de que os partidos têm agendas distintas da pauta estudantil de reivindicações. Os militantes dos partidos “instrumentalizam” as entidades estudantis para seus próprios fins, ao mesmo tempo em que suas discussões e divergências políticas “afastam” os estudantes do ME. Alguns filiados a partidos chegam mesmo, em acessos de tibieza, a concordar parcial ou totalmente com essas asserções, não levando suas bandeiras para manifestações, por exemplo.

Penso que toda essa linha de raciocínio é suspeita em termos democráticos e em grande medida falsa. Minhas objeções são múltiplas, e estão a seguir.

Os filiados e militantes das agremiações têm o direito de se manifestar nos movimentos e ingressar nas mais variadas entidades, sejam elas sindicais, estudantis ou de outro tipo. Eles também podem se organizar para influenciar a condução desses grupos, desde que não violem a lei e as regras estatutárias internas, quando estas existirem. Restringir sua ação seria inconstitucional e antidemocrático, pois criaria um viés injustificável a favor da atuação das pessoas sem vinculação partidária.

Há também uma objeção pragmática. Convido o leitor a fazer o seguinte experimento mental: retire do ME os militantes partidários e veja o que sobra de militância organizada. O descenso do movimento estudantil na UFRN no período 1989-91 coincidiu justamente com a crise de uma de suas principais facções partidárias: a vinculada ao PCB. Se os partidos saíssem das entidades estudantis, haveria provavelmente uma redução brutal na quantidade de atividades realizadas atualmente pelo ME.

Objeto ademais à tese da suposta diferença entre a pauta dos partidos e as “bandeiras” do movimento estudantil. Esta crítica à atuação dos partidos é especialmente frágil, ao supor ingenuamente que as reivindicações do ME estão descoladas do debate público mais amplo no Brasil. Na verdade, a posição dos partidos informa os termos do próprio debate das metas do ME em muitos casos.

Um bom exemplo disso é como responder às mudanças provocadas pelo Reuni, o programa de expansão do ensino superior federal criado pelo governo Lula (2003-10). Estudantes mais críticos do programa podem, por exemplo, endossar as posições defendidas por setores da oposição de esquerda àquele governo, asseverando que o programa prejudica o acesso dos alunos às estruturas universitárias de assistência estudantil. Estudantes próximos às posições petistas podem rebater dizendo que o aumento das vagas compensa um período de transição com certas carências. Por fim, estudantes mais à direita poderiam defender a massificação proposta pelo programa, mas reservando a certas universidades e institutos a posição de “centros de excelência”.

Não existe uma régua externa ao mundo para dizer que um assunto é pauta partidária e o outro é apenas estudantil. Em uma democracia liberal, os partidos buscam influenciar e mobilizar os eleitores onde quer que eles estejam, oferecendo posições para o debate, e divergindo visto que estão também a competir entre si no mercado eleitoral. Esta competição garante a alternância no poder e a busca pelo aprimoramento das políticas públicas no afã de satisfazer o eleitorado.

Os adeptos do chamado “apartidarismo” parecem esposar uma concepção de política que glorifica movimentos sociais espontâneos, “horizontais” e “descentrados”. Nada tenho contra tais movimentos, mas sugiro que eles se articulem com as instâncias partidárias e institucionais. O registro público das conquistas dos partidos políticos é grande, bastando para firmá-lo uns poucos exemplos. O PMDB foi central na redação de muitos capítulos da atual Constituição, incluindo vários avanços, reconhecidos como tal por analistas e pelas mais diversas forças políticas. Quadros ligados ao PT ajudaram a formular e executar praticamente toda a política social vigente no país. A coesão do PSDB e do DEM foi fundamental para eliminar a CPMF em 2007, um imposto cujo formato apresentava elementos questionáveis para muitos contribuintes.

Por fim, não acredito nos males do “aparelhamento” das entidades estudantis, ou pelo menos não creio que eles sejam tão negativos quanto se diz. A Central Única dos Trabalhadores, por exemplo, é ocupada de cima a baixo por quadros ligados ao PT. Isso a torna, por óbvio, menos crítica ao Governo Dilma, mas não impede que faça ameaças veladas de afastamento àquele, que podem melhorar a posição dos seus sindicatos em negociações. Isso se verificou recentemente no caso de diversas greves de funcionários públicos federais de sindicatos ligados à central, quando esta usou claramente seus canais no governo em certos dissídios salariais.

Termino o texto com o apelo para que se ponha um paradeiro ao discurso antipartidário. No fundo, ele atenta contra a nossa democracia representativa, uma das mais fortes do mundo em termos de participação eleitoral, e em nada ajuda a superar seus problemas.

Filiem-se a partidos. Militem nesses partidos. Mudem esses partidos se não gostam de sua operação interna. Contribuam, inclusive financeiramente, para as campanhas eleitorais que julguem serem as melhores – isso seria uma forma até de reduzir as patologias criadas pelo caixa 2 eleitoral. Debatam e divirjam, entrando ou não nas agremiações. Não tenham vergonha de tomar partido.

Carta Potiguar

Conselho Editorial

14 Responses

  1. Lucila disse:

    O problema é que a juventude, enfatizada no artigo, não sabe pelo que tomar partido. Não sabe para que os partidos servem. O problema é que os modelos de esquerda que deveriam seguir estão muito bem, confortáveis com as distrações que o capitalismo lhes proporcionou. E, os de direita, sabem que a melhor doutrinação é propagar que não há doutrina a ser seguida e que isso de lutar por alguma coisa é muito entediante. O problema é que não se conheceu muito além das distrações ao longo dos últimos trinta anos. Li, a pouco, no twitter, um rapaz brincando com a remota possibilidade de se dedicar ao socialismo, quando tem que se distrair com um brinquedo colorido dado de brinde por uma grande rede de fast-food. É essa a palavra de ordem na média da jovem população ocidental deste planeta. Imagine, em uma pequena capital na região mais marginalizada deste país?

    • Alan Lacerda disse:

      Não quero contestar todo o comentário – apenas a parte referente aos jovens de direita. Um passeio pelo sítio da Juventude do DEM mostra que eles têm ideias e doutrina sim: http://www.juventudedemocratas.org.br/

      • Lucila disse:

        Não questiono a existência de jovens partidários, de qq orientação. Mas, conforme o artigo discutiu, questiono o jovem apartidário, sobre os quais os doutrinadores de esquerda se furtam de atuar e, os de direitas, derramam mensagens conformistas e consumistas.

  2. Túlio Madson disse:

    “Alguns filiados a partidos chegam mesmo, em
    acessos de tibieza, a concordar parcial ou totalmente com essas asserções, não
    levando suas bandeiras para manifestações, por exemplo.”

    Esse posicionamento você
    mesmo esclarece a seguir:

    “Eles (os filiados) também
    podem se organizar para influenciar a condução desses grupos, desde que não
    violem a lei e as regras estatutárias internas, quando estas existirem.”

    Só havia uma regra básica “estatutária
    interna”, na Revolta do Busão, a saber: não levantar bandeiras de partidos,
    isso foi acordado inclusive em plenárias, decidido pela maioria, inclusive
    pelos próprios militantes de partidos. Logo, não levantar bandeirar é um ato
    democrático, acertado pela maioria do movimento em amplas discussões, portanto,
    seria antidemocrático fazer isso dentro dos limites daquela manifestação.

    “Termino o texto com o
    apelo para que se ponha um paradeiro ao discurso antipartidário.”

    Fazer um apelo para QUE SE
    PONHA um PARADEIRO a qualquer discurso político, seja partidário ou não, é
    democrático?

    “No fundo, ele atenta
    contra a nossa democracia representativa, uma das mais fortes do mundo em
    termos de participação eleitoral, e em nada ajuda a superar seus problemas.”

    Acertou em cheio, agora, com a terminologia “democracia representativa”,
    democracia e representatividade não surgiram juntas, democracia é o acesso
    deliberativo direto do cidadão às questões públicas. “Democracia representativa”
    é uma fusão do conceito grego de democracia com a representação advinda das
    monarquias absolutistas, a ideia de que um, ou poucos, “representam” os demais.
    E é isso que “representa” os partidos: esse modelo representativo.

    Acontece que há um fenômeno mundial de crítica a essa “democracia
    representativa”. Em muitos lugares do mundo como Chile, Espanha e Grécia se busca
    por um modelo mais democrático e menos representativo (na Espanha chamado de “Democracia
    Real Ya!”), portanto, tenho orgulho de jovens da minha cidade que encabeçam,
    até com certo pioneirismo no país, essa tendência política que se concretiza na esquerda mundial (principalmente entre os jovens). Tomara
    que continuem tomando partido, mesmo sem partidos.

    • Lucila disse:

      Acho que não há dúvidas que uma reforma política no Brasil e no mundo é necessária. Mas, tb acho que uma busca com a ruptura de modelos de atuação política não deve ser a ênfase de um movimento social, esse deve ser um reflexão filosófica dentro do grupo, não uma determinação baseada em uma tendência mundial. Nem o Brasil nem o RN tem a maturidade política para simplesmente adotar um modelo de outras sociedades mais maduras. Ainda, embora haja muita mobilização juvenil pelo mundo, tenho lido a opinião de especialistas que questionam a ausência de agendas. Fico retiscentes com essa massificação e diluição de posicionamentos. Tendo a acreditar que a diversidade é a base da evolução. Tem mais impacto quem sabe agregar essa diversidade e tirar dela propiedades emergentes, novas, em lugar de diluir o que existe.

      • Túlio Madson disse:

        Essa “tendência mundial” é apenas uma relação que eu fiz, há pouco ou quase nenhum debate interno acerca disso dentro do movimento, portanto, as deliberações não são pautadas nessa “tendência mundial”. De fato, a ausência de uma agenda pragmática é algo que permeia esses movimentos espontâneos e horizontais mundo afora, mas acredito que no nosso caso (Fora Micarla e Revolta do Busão) houveram sim pautas bastante delimitadas, com resultados igualmente pragmáticos.

        Mas, transformar uma manifestação num carnaval é fácil, difícil é
        construir o que permanecerá amanhã, essa é uma crítica que cabe tanto aos manifestantes daqui, quanto aos de outros lugares. Mas temos que considerar que é um fenômeno novo e estamos engatinhando ainda, mas a cada nova manifestação e movimento tais “apartidários” vão amadurecendo e se politizando cada vez mais.

        O mais importante é a consolidação de que os partidos de esquerda, ao contrário do que pensam, não são as ÚNICAS vias de transformação na cidade, e isso já está bastante estabelecido. Além de refutar a crença de que os mecanismos representativos devem catalisar
        toda e qualquer mudança, quebrando o discurso que prega que mais democracia é mais representação.

        Esperemos os próximos passos então.

        • Lucila disse:

          Acho os movimentos surgidos nos últimos anos em Natal podem ser muito importantes para a politização da geração que participou. Lembro de, na minha época, a ETFRN (vixe, que velhice), mobilizar muitas passeatas sobre temas gerais, alheios ao cotidiano da cidade. Embora muito bem embasados, politicamente, pelo grêmio estudantil, estes não tiveram impactos históricos, talvez por não terem uma motivação local, como o Fora Micarla e a Revolta do Busão. Acho que é importante que esses movimentos potiguares, ou que surgir de mobilização destes, tragam para a pauta o debate sobre o papel da representação política, o papel da sociedade organizada e o papel do indivíduo efetivamente cidadão. O que temo é que, desses movimentos, não surja nada. Que tenham sido reativos a uma situação extrema, que foi o desgoverno Micarla, e que entrem em combustão espontânea, quando não houver mais um “inimigo visível”. O único meio de evitar isso, ao meu ver, é a reflexão, o debate e a organização, seja social ou partidária. Espero não ser necessário sempre uma Micarla para que a juventude potiguar tenha uma agenda.

        • Alan Lacerda disse:

          Os resultados que vocês obtiveram, e a eventual permanência deles, passaram e passam por instituições representativas. Foi um vereador do PSB o propositor do decreto de revogação do aumento. Modelos alternativos à democracia representativa jamais se consolidaram, funcionando no máximo como complementos. É assim com os modelos de democracia direta, participativa, deliberativa, etc.

    • Alan Lacerda disse:

      Meu caro. O apelo no texto é argumentativo, não é uma ameaça. Quanto aos movimentos europeus (não conheço o caso chileno) que cita, nada de concreto obtiveram até agora. Não dominam os problemas que geraram a dívida pública, raiz da crise atual, e não apontam soluções articuladas com as instituições para sua solução. Os próprios Occuppy a nada chegaram, até pelo caráter excessivamente genérico de suas bandeiras. PS: eu desconhecia as regras da Revolta do Busão, mas, mesmo que tenha sido o caso, mantenho minha opinião: se eu fosse militante de partido na manifestação, não aceitaria essa regra inconstitucional.

  3. Acho que é extremamente válido para o movimento estudantil a participação de integrantes nos partidos, visto que se pode utilizar como arcabouço as propostas da política em sentido amplo para a política estudantil. O problema é a forma deturpada que se usa como palanque eleitoral, o ideal deveria ser utilizar os princípios partidários para os estudantes e não ao contrário, usar o movimento estudantil para fortalecer o partido.

    • Alan Lacerda disse:

      Não vejo nenhum problema em palanques eleitorais ou lideranças eletivas formadas a partir do ME. Lindbergh Farias começou na UNE, fez seu nome lá, depois foi um prefeito bem avaliado em Nova Iguaçu. Muita gente reclama que os partidos são fracos no Brasil em alguns aspectos: por que não fortalecê-los a partir da juventude universitária? Acho a separação entre “política partidária” e “política estudantil” artificial e forçada.

  4. Daniel Menezes disse:

    É a incongruência que venho falando desde o #ForaMicarla: a pessoa reclama da Câmara, crítica os vereadores, mas não aceita alguém se organizar, dentro do próprio movimento, para mudar a Câmara criticada.
    No início dos movimentos, faltava uma certa “pedagogia” dos partidários para com os não partidários, de mostrar, justamente, o que foi dito acima no seu texto, de mostrar a importância dos partidos.
    No entanto, sempre fui a favor de partidos e de suas atuações.
    Na prática, professor Alan, mesmo na Revolta do Busão se votando contra bandeiras e camisas, foram os partidários, pelo treinamento político que já tinham e maior organização, que acabaram ditando como o movimento deveria se comportar.
    Esse “espontaneísmo” pregado pelos “apartidários” só tende a enfraquecer a própria força dos movimentos e, pior, a força de possíveis desdobramentos: mudar os próprios partidos, naquilo que os “apartidários” se sintam não contemplados, vereadores e prefeitos.

    • Alan Lacerda disse:

      É isso aí. E quem construiu a peça legislativa da reversão do aumento foi um filiado a partido político, o vereador Júlio Protásio (PSB), agora reeleito. Não adianta fugir da política…

  5. marisa disse:

    Monitoramento e rastreamento remoto do cérebro humano por satélite terrorismo no Brasil

    Os cérebros dos brasileiros estão sendo conectados à satélites para fins de tortura e assassinato e o governo continua ignorando os fatos. Essa tecnologia é controlada por uma rede global de criminosos esses elementos adentram o cérebro humano 24 hs a conexão pode vir de várias pessoas ao mesmo tempo, leitura do córtex visual através da interface cérebro computador utilizando antenas de telefonia, satélite e o cérebro humano. Essa arma sonora é perigosa através dela é possível inserir sons e imagens direto no crânio do alvo com auxílio de ondas acústicas, vibracionais de rádio frequência eletromagnética com o uso de implante ou impressão cerebral. Os elementos que compõem o bando que estão ignorando às leis são formados por quadrilhas inteiras que estão usurpando estes corpos. O crime organizado utiliza essa tecnologia no tráfico de drogas e gente para fraudar concursos públicos, vestibular ou simplesmente para atormentar, atordoar, torturar pessoas comuns que não fazem idéia de que isso exista. Leiam mais v2k technology, voice to skull, nano implant brain radar synthetic telepathy gang stalking world, target individual, microwaves in remote neural monitoring psychotronic Weapons, mk ultra remoto neural monitoramento por satélite terrorismo no Brasil. Já existem inúmeras vítimas no nosso país isto está acontecendo no mundo todo. Pessoa alguma está isenta de ser conectado e se tornar uma vítima. Recentemente foi aprovada uma lei nos EUA contra o uso de armas geofísicas climática e controle mental, gostaria de saber a opinião da população e autoridades brasileiras à respeito desse tipo de crime no país.

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