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Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 1 de dezembro de 2012

Mapa da violência 2012: reflexões

postado por Thadeu Brandao
Do Gedev.blogspot.com.br
Por Thadeu Brandão, Professor da UFERSA
Nesta semana que se encerra, o CEBELA (Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos) sob a coordenação de Julio Jacobo Waiselfiz, publicou mais uma edição do já aguardado “Mapa da Violência”, estudo publicado anualmente desde 1998 sobre os homicídios do Brasil.
O homicídio é o grande medidor da violência em países como o Brasil. Isto porque a denominada “mancha negra”, ou seja, a ausência (ou quase) brutal de notificações e registros de outras modalidades de crimes faz com que o homicídio, infelizmente, seja o mais notificado. Mesmo assim, existe um certo gradiente de subnotificação nas mortes violentas do Brasil. Mas, o homicídio ainda é a notificação mais confiável. Os dados são fornecidos pelo DATA SUS, sistema de informações do Ministério da Saúde, via hospitais e ITEPS de todo o país.
O Mapa 2012, intitulado “A cor dos homicídios no Brasil” não traz nenhuma novidade para os estudiosos da área e para os que acompanham a série há algum tempo. O perfil das vítimas de homicídio no Brasil vem sendo o mesmo há bastante tempo: jovens, pobres e negros. Um detalhe: na metodologia adotada pelo Mapa, negro é uma categoria que abrange também os denominados pardos (IBGE). Daí que, muitos “analistas midiáticos”, “jornalistas da área policial” e até estudiosos sérios não concordarem com essa metodologia no tocante à classificação do “negro” no Brasil, utilizada pelo Mapa. Dada a sua historicidade e padrão vitimológico, não vejo problema algum em seu uso.
O Mapa 2012, mostra “queda do número absoluto de homicídios na população branca e de aumento nos números da população negra”. Eis a maior evidência. A Bahia teve aumento de 295% e a PB de 209%. Em números absolutos, os estados de AL, ES e PB são os que apresentaram as maiores taxas de homicídios negros com respectiviamente: 80,5, 65,0 e 60,5 para cada 100 mil habitantes.  Vale lembrar um detalhe que o Mapa não apresentou: a Paraíba é o estado com menor população percentual de afro-brasileiros. Por isso, levando-se em consideração este detalhe, seu percentual de jovens negros mortos é muito maior que os demais. Isso já vinha sendo apresentado nos Mapas anteriores (2010 e 2011).
Um exemplo sistematico disso é que a capital paraibana é que lidera em assassinatos de negros: “João Pessoa para cada branco que é assassinado, proporcionalmente morrem 29 negros pela mesma causa”, informa o Mapa. Já Natal é o 19o município onde mais se assassinam jovens negros do Brasil (é a 9a entre as capitais). O Rio Grande do Norte é o 15o  entre os estados em homicídios de negros.
Quando o Mapa visualiza Mossoró, esta tem uma taxa de vitimização de negros de 72,6/100mil hab. Já a de brancos é de 22,9/100mil. Contraste similar ao nacional. Para efeito comparativo, enquanto a taxa de vitimização de negros em Natal é de cerca de 59/100mil a de Mossoró é de 72/100mil.Outro exemplo: enquanto a vitimização de brancos no RN é de cerca de 12/100mil/Ha, a de negros é de 68,9/100mil/Hab. Distorção parecida que ocorre com as taxas verificadas nos municípios.
Entre 2002 e 2010: se a taxa de homicídio de jovens brancos cai de 40,6 para 28,3 em cada 100 mil habitantes, o que representa uma queda de 30,1%, a taxa dos jovens negros não acompanhou esse movimento, pelo contrário, ainda cresceu, passando de 69,6 para 72 homicídios em cada 100 mil jovens negros.
O Mapa mostra que esse movimento contraditório: “queda dos índices de homicídios brancos e aumento dos negros, vai determinar um crescimento significativo nos índices de vitimização dos jovens negros: se em 2002 era de 71,7% – morrem proporcionalmente 71,7% mais jovens negros do que brancos – esse índice eleva-se para 108,6% no ano de 2006 e, no ano de 2010 o índice se eleva para 153,9%. Ou seja, em 2010 morrem proporcionalmente 2,5 jovens negros para cada jovem branco vítima de assassinato, índice que pode ser considerado inaceitável pela sua magnitude e significação social”.
Duas reflexões gerais podem ser obtidas, além das esboçadas: primeiro que o assassinato de jovens, pobres e negros (ou pardos) cosntitui um verdadeiro holocausto brasileiro. Mata-se, em massa, um grupo específico de nossa população. Essa vitimologia é clara e incisiva: as políticas públicas que desejem combater homicídios devem objetivar esse grupo. Políticas generalistas não terão efeito nem a curto e nem a lomgo prazo. Além disso, o Mapa mostra a necessidade de inclusão da juventude negra ao status de cidadão o mais rápido possível.
Outra reflexão é que o período de maior crescimento de homicídios de jovens negros e o recrudescimento de mortes violentas de jovens brancos se dá na “Era Lula”, ou seja, durante o governo do PT. Herança maldita ou não, não vem ao propósito dessa análise, isso também coincide, como já verifiquei em outros estudos, com o aumento vertiginoso do encarceramento neste mesmo período. As variáveis se encontram e exigem mais reflexão e resposta. Aos gestores públicos e à sociedade como um todo.

Thadeu Brandao

Sociólogo, Professor de Sociologia da UFERSA.

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