Rio Grande do Norte, segunda-feira, 29 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 6 de dezembro de 2012

Caso Raniere/George: Um argumento irrefutável

postado por Jules Queiroz

Não consegui encontrar em qual reportagem li um trecho interessante do parecer do Procurador Regional Eleitoral, Paulo Sérgio Duarte, no caso dos vereadores Raniere Barbosa e George Câmara. O Procurador, pelo que lembro, afirmava que há diversas barreiras legais e jurisprudenciais à cassação de mandatos em virtude de atos de corrupção eleitoral. Se é tão difícil cassar o mandato de uma pessoa que cometeu atos ilícitos, como punir com tanta facilidade pessoas que foram na verdade vítimas de meros erros técnicos?

Segundo o Procurador, essa situação violaria o princípio da soberania popular.

De fato.

Tanto a legislação quanto a jurisprudência colocam vários percalços no caminho de quem busca punir o candidato beneficiado por atos de abuso de poder ou corrupção eleitoral.

Basta citar uma curiosa construção da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: a Corte Superior entende que só é possível a aplicação de punição por captação ilícita de sufrágio (compra de voto, cá entre nós) caso haja “prova robusta”. Mas o grande problema é: o que é “prova robusta”?

A jurisprudência criou, então, esse curioso requisito como um conceito indeterminado. A cabeça de cada juiz irá dizer qual prova é ou não robusta.

E o pior a se questionar: em caso de outros ilícitos a prova não precisa ser robusta? Pode ser uma “prova magra”?

Me parece que a discussão jurídica nas eleições acaba muitas vezes descambando para a restrição à propaganda eleitoral e esquecendo outros assuntos de maior importância. A legislação, com certeza, se preocupa muito mais em regular a propaganda na internet, em outdoor ou sei lá onde do que fornecer ao Ministério Público e ao Poder Judiciário meios eficientes de controlar atos ilícitos vinculados ao abuso de poder.

Aí, acabam chovendo sobre a Justiça Eleitoral demandas fundadas na desobediência a regras de propaganda. A legislação coloca no colo do juiz o serviço de fiscal da Secretaria Municipal de Urbanismo. Nobre e importante serviço, com certeza, mas não me parece que a estatura constitucional do cargo de juiz sirva unicamente para isso.

A tão falada reforma política, por outro lado, acaba discutindo apenas tecnicalidades: voto distrital, unificação de mandatos, etc. O que se chama de reforma política se tornou uma reforma meramente eleitoral. Não toca nos vícios das relações de poder que na verdade maculam a política nacional. Do financiamento das campanhas só se fala para aparentar profundidade na discussão.

E nessa pegada, o status quo mostra como o certo na história era o professor Raymundo Faoro: “O Estado, pela cooptação sempre que possível, pela violência se necessário, resiste a todos os assaltos, reduzido, nos seus conflitos, à conquista dos membros graduados do seu Estado-maior.”[1]


[1] FAORO, Raymundo. Os donos do poder – formação do patronato político brasileiro. 3a ed. Rio de Janeiro: Globo, 2001, p. 886.

Jules Queiroz

Procurador da Fazenda Nacional em Brasília/DF - @julesqueiroz

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