Rio Grande do Norte, domingo, 19 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 15 de julho de 2013

7ª DP: O Caos Revisitado

postado por Ivenio Hermes

O Caos Revisitado (3)Uma tonalidade a mais de desrespeito

Nada mudou

Em 18 de dezembro de 2012, visitamos a 7ª Delegacia de Polícia Civil, localizada no bairro Quintas, e realizamos um levantamento fotográfico objetivando sensibilizar o Governo do RN sobre as condições caóticas em que os policiais trabalhavam naquela DP. Seis meses após aquela visita, voltamos àquele ambiente para registrar quais providências haviam sido tomadas e sem nenhum espanto constatamos que nada foi feito.

Nada foi feito e os policiais de plantão já descreem da imprensa que já os visitou várias vezes nesse meio tempo, fotografou e nada publicou a respeito.

Como analista de segurança pública fui convidado para registrar o quadro atual em que se encontram as instalações. Naquelas ruínas, pois aquilo não pode ser mais chamado de prédio, já habitaram encarcerados, contudo de lá foram retirados porque a construção não reunia condições mínimas para que seres humanos ali vivessem.

Enquanto o sistema penitenciário considerava o local inapropriado para o ser humano, não há nenhuma autoridade que assim o considere para evitar que policiais civis nele trabalhem todos os dias e durante a noite, um cabo aposentado da Polícia Militar nele permaneça fazendo a guarda patrimonial.

As condições subumanas são visíveis e qualquer gestor público que tenha o mínimo interesse em seus servidores tomaria uma atitude para evitar que eles adoecessem ou perdessem o interesse pelo trabalho, contudo o caos que foi constatado em dezembro de 2012 piorou mais ainda e hoje, os servidores e o público que utilizam aquelas instalações sofrem risco de morte.

O Caos Revisitado (4)Relatos do descaso

Enquanto estávamos visitando a 7ª DP, entrevistamos alguns servidores e recebemos deles relatos sobre o descaso em que trabalham. Percebemos a indignação no olhar dos servidores e a apatia que se instalou neles devido à incredulidade no Governo do RN, e assim, desmotivados, alguns já em aparente depressão, eles comentaram suas situações.

  1. Só promessas. Após a divulgação do artigo 7ªDP O Retrato do Caos os servidores daquela delegacia receberam a promessa de que seriam retirados daquele prédio e após seis meses eles continuam sem nenhum posicionamento do Governo do RN;
  2. Medo de Retaliação. Numa atitude deles mesmos, chamaram o Corpo de Bombeiros para avaliar o prédio. A equipe os visitou disse que o prédio não possuía condições de habitabilidade, entretanto, ao serem solicitados sobre um laudo que os policiais pudessem usar para motivar uma ação do Governo do RN, eles temeram por seus empregos e disseram que não podiam fornecer tal laudo;
  3. Passando Vergonha. Delegado, agentes e escrivão tentaram até manter o local nas “menos piores” condições, mas já passaram vergonha por causa daquele local. Em certa ocasião uma senhora teve sua saia engatada num vergalhão exposto e consequentemente a saia rasgou-se, e eles usaram uma marreta para dobrar o pedaço de ferro para dentro do reboco e evitar uma situação mais degradante;
  4. Embaraço ou receio. Em outra ocasião tentaram falar com Delegado Geral, mas ele teria respondido que se tentasse expor aquela situação ao Governo do RN seria muito embaraçoso.

E Quintas continua sendo um bairro com dezenas de ocorrências, mas como a maioria delas acontece à noite, a 7ªDP passa o dia atendendo pequenos delitos. Os policiais se encontram desmotivados, o delegado não tem mais vontade de se empenhar em busca de soluções. Eles até pensaram em comprar tinta para cobrir um pouco daquela sujeira que se apresenta nas paredes, mas lembraram que em ocasiões anteriores quando assim o fizeram tiveram seu gasto próprio utilizado em benefício da administração pública que se autoproclamou a desencadeadora e executora da referida obra.

Sem condições de prestar o serviço público que é seu dever de ofício, os policiais passam os dias revivendo outros tempos. A equipe continua com apenas 01 delegado que acumula outras delegacias, 02 agentes e 01 escrivão, que vive afastando os documentos de um lado para o outro do cartório, e assim faz com seu computador e armários para evitar que a água que mina do teto e das paredes estrague peças processuais e material de trabalho.

Durante nossa visita a água pingava do teto, havia umidade na tela dos computadores, o teclado do computador da sala do delegado e da sala do escrivão foram molhados durante a chuva da noite e provavelmente estariam estragados.

São esses e muitos outros relatos deprimentes que saem da boca dos agentes que ali trabalham, cujo bom humor serve apenas para disfarçar seu desapreço pela forma como eles vem sendo tratados.

O Caos Revisitado (11)Por dentro e por fora

A 7ª DP continua merecendo a visita de engenheiros de segurança, da OAB, do CREA, de membros dos direitos humanos, de bombeiros que tenham lastro para assinar laudos, enfim, de pessoas ou entidades que possam impedir que os policiais daquela delegacia continuem sofrendo tal humilhação.

A deterioração interna que relatamos no outro artigo, agora dá sinais de possíveis desabamentos.

  1. Há lodo e fungos nas paredes;
  2. Toda a delegacia fede;
  3. O piso é úmido e escorregadio;
  4. O alojamento continua sendo um buraco, cuja segurança é feita por escoramentos rudimentares e improvisados na janela desprotegida;
  5. Os banheiros estão sem condições de uso;
  6. A copa está completamente contaminada pela sujeira contida nas paredes molhadas e a senhora que realiza a limpeza até tenta disfarçar o cheiro com produtos fortes que irritam até os olhos;
  7. O guarda patrimonial que fica guarnecendo a delegacia durante a noite é um cabo da Polícia Militar que conseguiu esse trabalho para adicionar 500 reais ao seu salário, mas ele mesmo teme por sua vida num possível desabamento.

E se o interior daquelas ruínas está assim, imaginem o exterior. Um colega que me acompanhava durante o levantamento fotográfico e as entrevistas com os policiais ficou abismado com tudo que viu.

Durante nossa verificação pela área externa, vimos um mamoeiro que cresceu de um buraco no calçamento mal feito e ao passarmos perto um buraco abriu no chão. Aquilo pegou a todos de surpresa, eu que fazia as fotografias percebi quando o chão cedeu e minha perna esquerda entrou no buraco recém surgido. Felizmente não sofremos nada, com exceção das roupas que ficaram estragadas.

A estrutura comprometida dá sinais de que, a exemplo do piso externo, virá a ruir. Isso no mínimo causará danos aos materiais, processos e equipamentos que tenham resistido às goteiras, todavia o temor pela vida dos que ali trabalham ou um cidadão que por acaso esteja ali fazendo uma ocorrência.

Por dentro e por fora, acima e abaixo, nada deve ser aproveitado do prédio onde funciona a 7ª DP. Aquelas ruinas devem ser de uma vez por todas demolidas, para que, se for o caso de aproveitarem o terreno para construção de outra delegacia, utilizar como entulho para ajudar a aterrar, terraplanagem e começar desde as fundações.

O Caos Revisitado (20)Confira a realidade

A vegetação que brota das paredes, os ratos em maior quantidade, o reboco do teto ruindo, a caixa d’água com limo em seu interior, as lajes, pilares e vigas com ferragem expostas, o lixo nos fundos da delegacia, tudo contribui para que o retrato do caos tenha se encardido e se tornado uma tonalidade a mais de desrespeito ao trabalhador da segurança pública.

Muitos somente se importam com o policial quando dele precisam, mas aqui fica o convite para que as imagens do novo levantamento fotográfico realizado nesse mês de chuvas sejam presenciadas por todos que demandam que seus impostos sejam bem empregados. Visite a fanpage do Blog do Ivenio Hermes e confira as imagens, divulgando-as pelo Brasil inteiro, para que o resto da população brasileira saiba como um ambiente de trabalho pode ser responsável pela geração de trabalhadores sem motivação, deprimidos e sem condições de prestar um serviço público de qualidade que nossos impostos pagam.

_______________

LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO:

Os álbuns do levantamento fotográfico estão disponíveis nos seguintes links:

7ªDP O Caos Revisitado 01 http://migre.me/fo2hm
7ªDP O Caos Revisitado 02 http://migre.me/fo2k5
7ªDP O Caos Revisitado 03 http://migre.me/fo2lZ
7ªDP O Caos Revisitado 04 http://migre.me/fo2mH

_______________

SOBRE O AUTOR:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública, Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar, Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves.

Cezar Alves em Retratos do OesteArtigo escrito por Ivenio Hermes e publicado originalmente em parceria com o amigo e fotojornalista Cezar Alves (Coluna Retratos do Oeste) do Jornal De Fato.

Ivenio Hermes

Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Integrante do Conselho Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial. Facebook | Twitter | E-mail: falecom@iveniohermes.com | Mais textos deste autor

Comments are closed.

Segurança Pública

As Inverdades Propagadas no Estado Elefante

Segurança Pública

DEGEPOL: O Arquivo Morto