Rio Grande do Norte, domingo, 28 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 21 de outubro de 2015

O Maracanã agora

postado por Rafael Morais

galeria-1432-historia-estadio-mario-filho-maracana-65-anosNão vou dizer que não. Estava cheio de expectativa. Acordei na hora exata, nenhum minuto a mais. Mal tomei café. Sabe aquele mal humor de quem acorda ansioso?!

Não perdi tempo com distrações. Tomei o metrô na estação mais próxima e segui ansioso rumo ao Mário Filho. Botafogo, Flamengo, Largo do Machado. O coração pulava do peito a cada nova estação.

Com jogo seria melhor, evidente. O teatro dos maiores artistas do futebol, como nosso Marinho Chagas o intitulou genialmente, sem seus protagonistas nunca será o mesmo. Mas o tempo curto e a data escolhida – praticamente a única – não permitiram essa honraria.

Catete, Glória, Cinelândia e estação Carioca. Já imaginava, nos meus mais longes devaneios, o Rio correndo para o Maracanã. De trem, metrô, a pé, com sede de título e muita fome de gol.

Uruguaiana! Ahh, essa eu já conheço. Anteontem mesmo bati perna por suas charmosas ruas e ruelas repletas de história e saudosismo embutidos.

Próxima estação, Presidente Vargas. Descem muitos. Central, Praça Onze, Estácio. Hora de trocar de linha. Da laranja para a verde. Estávamos bem próximos de chegar ao maior estádio do mundo, palco de momentos inesquecíveis do futebol brasileiro e mundial. De finais de Campeonatos Brasileiros, Cariocas, Libertadores da América e do primeiro Mundial de Clubes da FIFA, além de competições internacionais e partidas da Seleção Brasileira.

Cidade Nova, São Cristóvão e, finalmente, estação Maracanã. Foi fácil chegar. Olha só, a famosa rampa. É fácil mesmo, só seguir a rampa. Cheguei atrasado, o grupo das 11 horas iniciara a visita guiada a poucos minutos. Não tivesse eu, como minha mania de precaução, comprado os ingressos antecipados e corrido entusiasmado para não perder cada fala do guia, não chegaria a tempo.

Passamos pela tribuna de honra, bonita e cheirosa. Descemos para o camarote, ambiente restrito a população sofrida brasileira. Fomos na arquibancada, hoje sem o setor dos geraldinos. Cruzamos a área de hospitalidade (que legal!) e, entramos no vestiário, repleto de modernidade e camisas dos maiores e melhores jogadores mundiais da atualidade.

Chegamos ao campo de jogo, cercado por fitas isoladoras, reservado a quem sabe tratar a bola com carinho. Sentamos no banco de reservas, fotografamos, filmamos, admiramos o tamanho e a grandiosidade do estádio.

O guia, muito bem informado e formado – falava português, inglês e espanhol – falou a cada parada da visita, com dados técnicos sobre a construção e sobre os ambientes do novo Maracanã.

Certo momento, perguntaram em quanto tempo o estádio foi construído. O guia, seguro de sua resposta, disparou: – Três anos de obras, de 2010 a 2013.

Dei um pulo da cadeira, levantei o braço, mas fui impedido por Julita, ao meu lado, de interferir na resposta do guia globalizado.

Pensei comigo, e os esforços dos que construíram a ferro e fogo o maior estádio do mundo na década de 40? E a luta de Mário Rodrigues Filho, jornalista pernambucano, irmão de Nelson Rodrigues, que se destacou no apoio à construção do estádio, já que na época foi muito criticada pelo Deputado Federal Carlos Lacerda, inimigo político do prefeito da cidade, o general Ângelo Mendes de Morais? Isso tudo não conta? Isso tudo ele não conta?

Já no ponto final da visita, atrás da trave esquerda, me bateu uma angústia parecida com a que senti quando descobri, duas noites antes, que a boemia da Lapa não existe mais. O Maracanã não é mais o maior estádio do mundo.

Woody Allen em “Meia Noite em Paris” disse bem, o tempo do outro é sempre melhor que o meu. O tempo do Maracanã maior do mundo, do Maracanã de Didi, Queixada, Zagallo, Zizinho, Dida, Barbosa, Jair Rosa Pinto, Garrincha, Heleno de Freitas, Nilton Santos, Marinho Chagas, Rivelino, Gerson, Roberto Dinamite, Romário e Petkovic não existe mais.

O Maracanã da Copa de 1950, do Uruguai de Schiafino e Gighia e do Maracanazo não é mais o mesmo. Não é o Maracanã dos 183.341 torcedores, do pobre, preto, sem dinheiro e sem camisa, do milésimo gol de Pelé, dos 333 gols do Galinho e das centenas de Joões entortados por um passarinho atrevido chamado Mané.

A visita guiada do Maracanã simplesmente ignorou a história daquele que um dia foi gigante. Fiquei triste com mais essa descoberta. A mística do maior do mundo não me tocou. As muitas reformas do estádio mudaram sua aparência. Preservaram a arquitetura externa e mexeram por dentro, na sua essência.

O Maracanã agora é apenas mais uma Arena moderna, gourmetizada e cara, muito cara, como tantas outras por aí.

O Maracanã agora menospreza seu passado mais rico, repleto de glórias e muitas, mas muitas histórias.

Rafael Morais

Comunicador Social pela UFRN. Experiência em assessoria de imprensa esportiva e atuação em televisão. Áreas de interesse: literatura e esportes em geral, com ênfase no futebol como a "teatrialização das relações humanas".

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