Rio Grande do Norte, quinta-feira, 16 de maio de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 14 de outubro de 2012

O lugar de Genoino

postado por Daniel Menezes

Sempre fui a favor da condenação dos organizadores do chamado, de uma forma um tanto quanto midiática, “mensalão”, caso tudo seja devidamente provado. Quem não é?

Agora, como num estado democrático de direito, a culpa deve ser provada e não presumida.

O raciocínio que diz: “tá na cara que existiu corrupção”, como alguns jornalistas levantam para o caso do mensalão, não é suficiente para punir ninguém (mas infelizmente está sendo!).

Como um apreciador do respeito as liberdades individuais, a maior contribuição dada pela teoria liberal política para a humanidade, vejo com certo pé atrás o modo como a sanha da imprensa alimenta o linchamento dos acusados do referido processo e o STF embarca na onda.

Paulo Moreira Leite, um dos articulistas mais lúcidos do país, lança luz sobre o tema.

Vale a pena conferir.

 

Da Revista Época

Por Paulo Moreira Leite

 

Nossos crocodilos ficaram sentimentais. Em toda parte vejo lágrimas que acompanham os votos que condenam José Genoino.

Na imprensa, em conversas com amigos, ouço o comentário, em tom de solidariedade. Parece consciência pesada, em alguns casos.

Não estamos diante de um melodrama mas de uma tragédia.

Genoino está sendo condenado num julgamento marcado por incongruências, denuncias incompletas e presunções de culpa que começam a incomodar estudiosos e acadêmicos. Foi isso que  explicou Margarida Lacombe, professora de Direito da UFRJ, em comentário na Globo News. Sem perder suavidade na voz,  a professora  falou sobre necessidade de provas contundentes quando se pretende privar a liberdade de uma pessoa. Não falou de casos concretos, não criticou. Fez o melhor: informou.  Lembrou como esse ponto – a liberdade – é importante.

Vamos começar.

O STF que está condenando Genoino absolveu Fernando Collor com o argumento de “falta de provas.”

É o mesmo STF que, em tempos muito mais recentes, impediu que o país apurasse, investigasse e punisse a tortura ocorrida no regime militar.

Então ficamos assim. José Genoino, vítima da tortura que o STF impediu que fosse apurada, será condenado por corrupção, ao contrário de Fernando Collor.

Parece o Samba do Crioulo Doido do Stanislaw Ponte Preta. É. Mas não é o texto. E a “realidade brasileira”, como se dizia no tempo em que a polícia política perseguia militantes como Genoino.

Não há provas materiais contra Genoino e tudo que se pode alegar contra ele é menos consistente do que se poderia alegar contra Collor. Mas as provas da  tortura são abundantes. Estão nos arquivos do Brasil Nunca Mais e em outros trabalhos. Foram arrancadas na dor, no sofrimento, na porrada, no sangue e, algumas vezes, na morte. Em plena ditadura, 1918 vítimas da tortura deixaram registros dessa violência nos arquivos da Justiça Militar.  Nenhuma foi apurada e, se depender da decisão do STF, nunca será.

Collor foi beneficiado porque  provas muito contundentes  contra ele foram anuladas. Considerou-se, na época,  que a privacidade do tesoureiro PC Farias havia sido violada quando a Polícia Federal quebrou o sigilo de um computador que servia ao esquema. Essa decisão – em nome da privacidade — salvou Collor.

Você pode dizer que os tempos eram outros e que agora não se aceita mais tanta impunidade. Aceita-se. Basta lembrar que, na mesma época, o mensalão do PSDB-MG virou fumaça na Justiça Comum. E quando Márcio Thomaz Bastos tentou mudar o julgamento do mensalão federal, alegou-se que era no STF que os crimes graves são punidos.

Vamos continuar.

Genoino está sendo condenado  porque “não é plausível” que não soubesse do esquema. “Plausível”, informa o Houaiss,  é sinônimo de aceitável, razoável. Olha o tamanho da subjetividade, da incerteza.

Isso porque ele assinou o pedido de empréstimo de R$ 3,5 milhões para o Banco Rural e por dez vezes refez o pedido.  Não é plausível imaginar que um presidente do PT fizesse tudo isso sem saber de nada, acreditam três ministros do Supremo.

Mas fatos que são líquidos e certos não comoveram a acusação com a mesma clareza.

O empresário Daniel Dantas deu R$ 3,5 milhões para amolecer Delúbio Soares e Marcos Valério e cair nas graças do esquema.  Não foram R$ 3,5 milhões subjetivos mas inteiramente objetivos.

Um pouco mais tarde, seu braço direito Carla Cicco assinou um contrato de R$ 50 milhões com as agências de Marcos Valério para transformar a turma do PT em geléia. Chegaram tarde. Depois de pagar a primeira prestação, a casa caiu e eles suspenderam o pagamento.

Como não gosto de pré-julgar, não acho que Daniel Dantas seja culpado por antecipação. Não acho mesmo. Vai ver que estava tudo lá, bonitinho. Também podia ser ajuda para o Fome Zero rsrsrsrsrs

Ou quem sabe fosse tudo para Valubio.

Mas não teria sido melhor que ele fosse ouvido no tribunal, para mostrar sua inocência?

Não teria sido uma forma de mostrar que a Justiça é cega?

Mas ela não foi.

O esquema privado do mensalão, informa a CPMI, chegou a R$ 200 milhões. Quantos empresários foram lá, dar explicações? Nenhum.

Alguém acha plausível, aceitável, razoável, que fossem inocentados por antecipação?

Não há nada “plausível” que se possa fazer com R$ 200 milhões?

Só a Telemig, que pertencia ao grupo Opportunity, de Daniel Dantas, entregou mais dinheiro às agências de Valério do que o Visanet, que jogou o petista Henrique Pizzolato na vala dos condenados logo nos primeiros dias.

O que é plausível, neste caso?

Nós sabemos – e ninguém duvida disso – que Genoino fazia política o tempo inteiro. Fez isso a vida toda, com tamanha inquietação que,  numa fase andou pela guerrilha do Araguaia e, em outra, ficou tão moderado que parecia que ia preencher ficha de ingresso no PSDB.

Chegou a liderar um partido revolucionário à esquerda do PC do B e depois integrou as correntes mais à direita do PT.

Então vamos lá. É plausível imaginar que Genoino tenha ido atrás de recursos de campanha? Sim. É plausível e até natural. Basta deixar de ser hipócrita para compreender. Política se faz com quadros, imprensa, propaganda, funcionários. Isso custa dinheiro.

Isso fez dele um dirigente que subornava  adversários para convencê-los a mudar de lado, como quer a acusação? Não.

Eu não acho plausível, nem aceitável nem razoável. Duvido inteiramente, aliás.

E se eu tiver errado, quero que me provem – de forma clara, contundente. Sem essas suposições, sem um quebra-cabeças que joga com a liberdade humana.

Sem fogueira de tantas vaidades.

Não chore por nós Genoino.

Alegou-se que a tortura não poderia ser apurada para preservar a transicão democrática.

A democracia avançou, as conquistas foram imensas. Mas os perseguidos, no fundo, bem no fundo, são os mesmos.

Não é um melodrama. É uma tragédia.

Daniel Menezes

Cientista Político. Doutor em ciências sociais (UFRN). Professor substituto da UFRN. Diretor do Instituto Seta de Pesquisas de opinião e Eleitoral. Autor do Livro: pesquisa de opinião e eleitoral: teoria e prática. Editor da Revista Carta Potiguar. Twitter: @DanielMenezesCP Email: dmcartapotiguar@gmail.com

One Response

  1. Lucas disse:

    Daniel, algumas consideraçoes sobre esse caso.

    Primeiro, o STF que julgou e salvou indevidamente o Collor nao é o mesmo do caso mensalao, a lembrar, Lula/Dilma colocaram 9 dos 11 atuais ministros da corte, portanto se houve julgamento mal feito, com ministros despreparados, o que nao considero viável em funçao das historias e curriculuns de cada um dos indicados, a culpa cabe aos dois, infelizmente o STF que condena, so se formou agora, e espero que a sociedade nunca mais aceite que se volte ao tempo em que as indicaçoes eram feitas pra salvar os bandidos. ainda ha erros, ha, o STF ainda tem uma certa seletividade no combate ao crime organizado que assola o serviço publico tem, mas isso nao pode ser motivo para o STF jamais começar a punir alguem. Temos ministros qualificados sim, nao acredito nessa hipotese de pressao, duvido que o Joaquim Barbosa se leve por pressao da Globo, nem a ministra Carmen Lucia, e todos os outros, se existe duvidas quanto a idoneidade de alguem pra votar seria com relação ao Dias Tofolli e justamente pelos motivos que tornaram o STF conhecido por nunca condenar ninguem.

    Segundo, duvido que algum deles esteja votando fora dos autos, e alem do mais nao sao meras ilaçoes, rubrica é rubrica, ta la, é prova mais do que inconteste, o emprestimo é ficticio, duvido que alguem assine um contrato envolvendo tanto dinheiro e nao saiba em que, nem como vai ser usado, fora o fato dele ser presidente do partido a epoca, é exigir muita inocencia das pessoas para acreditar na versao do Genoino e do PT com relaçao ao caso, achar que Delubio, um ilustre desconhecido mandava e desmandava sem ninguem saber, que no PT os emprestimos e as negociaçoes sao feitas sem autorização previa, tudo esta registrados, todos os encontros, reunioes, assinaturas, ta tudo la, nao tem como negar isso.

    Terceiro, Genoino foi o unico responsavel por jogar a historia dele na lama, querer culpar a imprensa da direita por isso é demais, alias, a imprensa da direita nada mais esta do que fazendo o jogo dela, assim como a imprensa pro PT tenta de todas as formas desqualificar o julgamento, mesmo contra todos os fatos, esquece que foi o Lula quem escolheu boa parte dos julgadores, enfim, os blogs jornalistas e veiculos de comunicação pro PT tambem nao estao de inocentes, nesse caso a unica inocente é a verdade que é assassinada pelos dois lados em prol unica e exclusiva de defender sua posiçao.

    Quarto, essa reação dos petistas, quer ver seu crime tratado como coisa normal, quer banalizar porque ate hoje nenhum outro crime parecido foi julgado, quer achar que a historia do Genoino é suficiente para absolve-lo de qualquer crime que ele cometa, estao de todas as formas tentando encontrar desculpas, alias agora que se tem condenaçao, sera que Dirceu, Delubio, Genoino e todos os outros serao expulsos do partido como reza o estatuto do partido, ou dane-se estatuto. como eu ja disse em outros posts, o PT esqueceu quem foi um dia, se juntou aos demais e deixou de ser alternativa, agora se tornou mais um a ser combatido

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