Rio Grande do Norte, segunda-feira, 29 de abril de 2024

Carta Potiguar - uma alternativa crítica

publicado em 8 de agosto de 2013

Corrupção: reprimir e induzir

postado por Jules Queiroz

Essa semana nos deparamos com duas medidas legislativas de combate à corrupção com conteúdos e consequências completamente diferentes e opostas.

A primeira é a Lei Federal nº 12.846/2013, que estipula penalidades administrativas e judiciais a pessoas jurídicas (empresas) que pratiquem atos lesivos ao patrimônio público por violação dos princípios funcionais da Administração Pública.

É um diploma legal que acerta cirurgicamente em um ponto nevrálgico do problema da corrupção no Brasil: sempre se perseguiu, puniu e achincalhou exclusivamente o corrompido. A legislação brasileira e os órgãos de persecução penal sempre partiram do pressuposto de que a corrupção nasce apenas da má vontade do agente público. O sujeito sombrio que tirou proveito econômico de atos de corrupção ficava impune, em regra (falo em regra porque a Lei de Improbidade Administrativa permite a punição judicial de pessoas jurídicas).

Agora, a Administração Pública pode aplicar pena de multa entre 0,1% a 20% do faturamento da pessoa jurídica. Trata-se de multa bem mais violenta do que aquela que possibilita a Lei de Improbidade. Por outro lado, a responsabilização por via judicial poderá resultar em perdimento de bens, suspensão de atividades, impossibilidade de contratação com o Poder Público e até mesmo dissolução da pessoa jurídica. Vê-se que, caso bem aplicada pela Administração e pelo Judiciário, temos uma lei para sufocar realmente os interesses escusos que andam pelos corredores do poder.

Outra iniciativa, essa muito menos louvável, é a da Câmara Legislativa do Distrito Federal: projeto de lei já aprovado e pendente de sanção do Governador propõe que a pessoa que denunciar crimes que envolvam corrupção no serviço público fará jus a 10% do valor recuperado do corruptor.

Ora, sou radicalmente contra. Primeiro por razões de competência legislativa que não cabe aqui discutir.

Em segundo lugar, moralmente se trata de ato questionável. Considere-se que a motivação da maioria dos atos de corrupção é justamente o vil metal (há quem o faça pela pura sacanagem da coisa?). Então, a Câmara Legislativa visa promover denúncias cujo estímulo é o mesmo vil metal.

Projeto dessa natureza, na verdade, está visando mutilar a consciência cidadã que move a denúncia e substituir a mesma pelo estímulo individualista do lucro. Sem falar que aí o cidadão “denunciante” estará levando um “porcento” do dinheiro público ilicitamente desviado. Quanto mais corrupção, mais lucra o cidadão.

Se, por um lado, evoluímos no combate à criminalidade do século XXI, do outro voltamos ao Velho Oeste macarrônico dos anos 60-70.

Jules Queiroz

Procurador da Fazenda Nacional em Brasília/DF - @julesqueiroz

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