Por Marcos Dionisio Medeiros Caldas
Agora é um frenesi só. Mas a realidade é dura e cruel.
Jornalistas estrangeiros viraram atração e não suas notícias. A síndrome de novo rico é tamanha que os jornalistas foram blindados até de seus colegas locais.
Ontem alguém me parou na rua e perguntou se não era hora de construir uma agenda positiva para aproveitar a visibilidade da Copa.
Agenda positiva se constrói com trabalho e mudança de comportamento dos gestores governamentais e com a materialização de ações e não com formidáveis verbas publicitárias.
Há esferas do poder que procuram dialogar e construir soluções para nossos graves problemas. A maior parte, todavia, no nosso RIO GRANDE DE MORTE, quer tratar o povo como um general no campo de batalha porque assim é tratada nos conclaves governamentais sob julgo autoritário.
Esqueceram que todo poder emana do povo e deve ser exercido em seu nome.
A partir de agora a visibilidade de Natal será total. Do RN também. Então, é necessário que as instituições públicas cumpram suas missões para evitar que essa visibilidade venha a matar nosso turismo e produzir uma outra falência econômica do nosso estado.
Ultrapassamos a cota de, pelo menos, 1550 assassinatos no RN. Para os familiares dessas vítimas, cuja grande maioria poderia ter sido evitada, não há possibilidade de agenda positiva. O máximo que se permitiriam era um bálsamo nos seus espíritos que a responsabilização dos seus algozes momentaneamente poderia produzir.
A violência é tanta e tamanha que famílias foram traumatizadas e quase destruídas para sempre. Comunidades perderam sua convivência necessária sob a égide de um medo separatista.
São 537 assassinatos em Natal e na véspera de ter seu segundo momento de visibilidade mundial.
Tenho falado ao deserto e reconhecido que o Turismo é o veio de desenvolvimento e que pode ser sustentável e nossa redenção e até justificar certos gastos perdulários que estão sendo feito em nome de preparar o Estado para a Copa. Não estou a falar do Arena das Dunas nem do estrupício da Roberto Freire.
Tenho dito, todavia, e sem qualquer retorno que ninguém prepara suas férias com suas famílias para um local onde se vive uma Guerra Civil.
Visitei ontem os profissionais da PM que estão em processo de reivindicação no entorno da Governadoria. Semblantes sérios e carregados como quem desempenha suas missões sem apoio e o devido reconhecimento.
São tratados pela Administração Ciarlini com indiferença ou ameaças.
Como os policiais civis, por sinal, também o foram. Passados quase três meses do final da Greve do SINPOL, o Governo já deixou de convocar 60 policiais civis que foram acordados em negociação atropelada e a fórceps.
Até quando o estado do RN postergará a criação de um imenso movimento para a reconstrução de um patamar mínimo de coexistência pacífica?
Até quando os humilhados e ofendidos da periferia continuarão a ser exterminados na tenra idade?
Até quando uma oportunidade para o desenvolvimento do RN será jogada na lata do lixo deixando como legado apenas as dívidas?
Já passou da hora dos que amam o RIO GRANDE DO NORTE, a terra de Poti, de Câmara Cascudo se levantarem civicamente e tomarem nas mãos o destino da nossa terra humilhada, destratada e ofendida.
A MICARLIZAÇÃO em curso precisa ser estancada civilizadamente e na forma da lei… Mas precisa ser barrada sob pena de termos que reconstruir o estado de escombros onde irão jazer dores, culpados e omissos.
Não me peçam agenda positiva. Essas notícia terríveis que somos obrigados a dar diariamente são imensamente menores que a tragédia cívica na qual mergulharam o nosso RN.
Não me esqueço da música de Milton Nascimento: “Aqui vive um povo que cultiva a qualidade / ser mais sábio do quem quer governar”.
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SOBRE O AUTOR:
Marcos Dionísio Medeiros Caldas, advogado e militante dos Direitos Humanos, Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos/RN e Coordenador do Comitê Popular da Copa – Natal 2014, com efetiva participação em uma infinidade de grupos promotores dos direitos fundamentais, além de ser mediador em situações de conflito entre polícia e criminosos e em situações de crise de uma forma geral.